Uma reunião terminada com cervejada e foguetório marcou o anúncio feito pelo prefeito Joaquim Rosa Pinheiro a diretores e membros da comunidade, na tarde do último sábado, 7, da construção de uma vila olímpica no patrimônio do 13 de Maio, no alto boa vista, utilizando uma verba de R$ 320 mil, viabilizada através de uma emenda parlamentar, proposta pelo deputado Aracely de Paula (PL). Segundo o projeto, a Prefeitura transformaria o atual campo em um campo society, construiria uma raia para atletismo, uma quadra coberta, uma piscina e transformaria o atual barracão em uma oficina de artes, passando o patrimônio ao município.
Segundo participantes da reunião, o prefeito após enumerar atos de sua administração anunciou a mudança do campo do 13 de Maio para outro local, para ali construir a vila olímpica. "O prefeito falou das coisas que ele está fazendo e disse que ia mudar o campo do Treze para construir a vila olímpica. A Maria Inês Sudário, a Toca, questionou sobre a mudança do campo e ele disse que não dá para reformar o campo, porque vai custar R$ 700 mil. Ele terminou a fala e mandou distribuir cerveja e guaraná para o pessoal. Na reunião tinha umas 50 pessoas. Além do prefeito, estavam os secretários, Roberto de Lourdes e Marcão Pires, o vereador Hélio da Farmácia e outros funcionários do prefeito", resumiu Benedito Roberto Ferreira, o Macalé, um dos fundadores do Treze de Maio. Maria Inês Sudário emendou: "eles trouxeram até os foguetes".
Macalé considera um desrespeito a proposta do prefeito. "Eles não procuraram os diretores, membros da comunidade para uma reunião, já chegaram com a coisa pronta. Deviam ter chamado a diretoria, realizado uma assembléia, mostrar o projeto, discutir com a gente. Maquete é uma fotografia do que vai ser. Projeto tem que ser aprovado em assembléia com o pessoal do Treze. Temos que opinar. E não vir de cima pra baixo. O prefeito está desrespeitando os fundadores do Treze de Maio, que lutaram contra o preconceito", disse mais Macalé, lembrando a fundação do clube.
"Quando fundamos o Treze de Maio, o negro não tinha espaço em Sacramento. No princípio e durante muitos anos, a presença do negro era vetada no Atlético, no campo dos Marianos e, mais tarde, no Sacramento Clube. O campo do Atlético era municipal, todos podiam treinar lá, mas quando a Câmara doou para o campo para o clube, aí impediam a gente de usar o campo, a mesma coisa aconteceu com o Campo dos Marianos. E ficamos sem lugar pra treinar. Fomos treinar lá onde é hoje a máquina dos Loyola", diz recordando a segregação racial da época.
Prosseguindo, disse mais Macalé que os filhos de pais negros não tinham onde se divertir. "Nossos filhos não tinham onde se divertir, faziam festinhas na casa do Azor... Foi quando criamos o Treze de Maio com o objetivo de fazer uma sede. Compramos o direito do terreno do Elder Domingos Lopes e pagamos sete mil cruzeiros por mês (promissórias anexas). A gente vendeu até rádio, tirou dinheiro do bolso para pagar a dívida. Esse patrimônio é do Treze de Maio, isso é nosso e só não conseguimos construir a sede por falta de recursos", lamentou.
Vila Olímpica, sim, mas perder a nossa história, não
O vice-presidente do Treze de Maio, Eliseu Inácio Alves (foto), 28, não esteve na reunião, mas passada a euforia, imediatamente foi comunicado da proposta do prefeito. "Eu não fui chamado para a reunião e estava trabalhando. Durante a campanha, o prefeito Joaquim prometeu arrumar o campo, esteve lá, olhou, gesticulou e disse que já estava vendo o campo arrumado e agora vem querendo fazer uma vila olímpica lá e mudar o campo de lugar", disse.
Para Eliseu Inácio, a vila olímpica é bem vinda, vai beneficiar a todos. Que seja construída, então, no lugar onde ele está querendo transferir o nosso campo. Será um patrimônio municipal e todos nós aqui da comunidade teremos direito de usufruir dele, sem perder nosso patrimônio aqui. Então, é preciso deixar bem claro que queremos a vila olímpica aqui no alto, mas queremos o nosso campo arrumado, conforme ele prometeu antes da eleição, com medidas oficiais e não um campo society. Não queremos outro terreno para o nosso campo, o nosso lugar é aqui, a nossa historia é aqui. Este local aqui não nos pertence, a nós que somos jovens, mas é de nossos antepassados e será de nossos filhos", analisou Eliseu, ponderando sobre a dívida ativa do clube: "O prefeito alega que tem dívida ativa, se tiver essa dívida podemos parcelar e pagar, não é motivo para pegar o que é da comunidade, como ele pegou o parque de Exposição que tinha dívida, e ninguém falou nada. Queremos preservar as nossas raízes. É um preço muito alto para ter melhorias no campo e não foi isso que o prefeito prometeu em campanha".
Eliseu argumenta ainda que como a comunidade já se juntou para trabalhar no campo, pode trabalhar de novo. "O prefeito diz que fica caro aterrar o campo, mas se tivermos um caminhão pra buscar a terra, nós podemos fazer o serviço, só não fazemos porque não temos recursos. O prefeito disse que faz 50 anos que o campo está daquele jeito e que se ele não arrumar vai ficar mais 50. Eu acho o seguinte, se cada prefeito que prometeu fazer alguma coisa pelo Treze nesses 50 anos, tivesse realmente feito um pouquinho que seja, e não passasse apenas de uma promessa eleitoreira, nosso patrimônio que serve à nossas comunidade, não estaria desse jeito. Todos os que passaram foram só promessas. Dessa vez achamos que teríamos sorte, mas o preço é muito alto", desabafou Eliseu.