Uma casa de alvenaria em ruínas, de três minúsculos cômodos. Uma única entrada dá acesso à sala, cuja porta é uma tábua. À direita de quem entra, uma minúscula cozinha com um fogão a lenha de onde sai a fumaça que inunda o minúsculo cômodo e esvai pelas aberturas de uma armação de vitrô, amarrado à parede. À esquerda, o quarto com uma cama de casal, bem em frente a um buraco na parede, onde a janela desabou e, no lugar, o casal colocou um pedaço de tábua e, à noite, um pano para proteção.
No teto do quarto, algumas telhas negras de fuligem, onde vê um rombo à direita, tampado com um pedaço de papelão e uma folha de isopor, sobre os quais, diz o morador, colocou uma porta de geladeira que encontrou no lixo para tudo não voar... Ao lado do quarto, o banheiro destelhado, com um vaso sanitário. Mas tudo limpo, casa varrida, as poucas roupas e cobertas organizadas, dobradas. Energia elétrica e água seriam artigos de luxo...
A casa descrita acima fica na rua Assyncrito Natal, nº 360. Ali, há dez anos, mora o casal Ivonete Cristina Eduardo e Paulo Sérgio Espiridião, mais conhecido por Ratinho (36 anos), que herdou a casa da mãe, Maria Aparecida da Silva. A sua comovente história de vida foi contada ao ET com um pedido de ajuda, para que o poder público, através de seus programas sociais, reforme o que eles chamam de casa.
“- Sou natural de Franca e, aos 16 anos, saí de casa... Fui andar pra aqui, pra ali. Fiquei sumido muitos anos trabalhando de bico e, infelizmente, me enveredei no mundo da bebida. Quando minha mãe me encontrou me trouxe pra cá e me arrumou a casa, que nunca conseguimos acabar de arrumar. Já pedimos ajuda ao pessoal da Prefeitura que vem aqui, fotografa e fica nisso...Nunca voltaram. Quem sabe agora, alguma alma de bem pode nos ajudar. A casa molha demais, tem vez que nem dá pra dormir. E nesse frio que está fazendo, está triste”, lamenta o casal.
Na vida de fazer 'bicos', pequenos trabalhos, Paulo diz que dá pra comprar comida. “Eu trabalho, faço bicos limpando quintais, apanhando café, trabalho nas roças, mas não é sempre que tem serviço e tem muitos que não gostam de dar serviço pra gente, mas graças a Deus a gente consegue um pouquinho pra comprar comida. Água a gente pede nos vizinhos, à noite, se precisar usamos vela, só sei que precisamos de ajuda”.
Paulo relata que já esteve preso duas vezes, a primeira por pegar uma troca de roupa num varal de uma casas, porque estava completamente sem roupas para usar e, a segunda vez, por se meter numa confusão. “Fiquei três meses preso”, conta.
Paulo dá lição de solidariedade
Durante a entrevista na casa de Paulo e Ivonete foi emocionante ver que quem tem tão pouco ainda é capaz de repartir. Na casa de Paulo estava o andarilho Vicente de Paulo Rodrigues, esperando uma lata d´água esquentar numa trempe de tijolos no quintal para tomar banho. Encontrado todo sujo na Rodoviária, foi socorrido por Ratinho e levado até sua casa para tomar um banho. E recebeu ainda de presente uma calça e uma camisa, pois usava apenas um calção.
“- Vicente fica na rua, dorme na rodoviária, mas essa noite fez muito frio e ainda está frio. Então, eu trouxe 'ele'pra casa pra se abrigar. Arrumei uma roupa, ele toma um banho quente e dorme aqui na sala, não dá aguentar esse frio lá fora à noite...”, conta, emocionando os repórteres.
O andarilho Vicente de Paulo Rodrigues diz ter 47 anos e é natural de Holambra (SP). “Lá em Holambra eu trabalhava em lavoura de flores, mas há cinco anos vim pra cá, com um amigo, trabalhar na carvoeira. Mas, o dono foi embora, sumiu, não pagou e eu fiquei aqui até hoje. Vou vivendo, peço uma comida aqui, ali. Graças a Deus nunca fui preso, nunca peguei nada de ninguém. Já fui trabalhador, tinha mulher, filhos... Larguei tudo e vim pra cá, só que não deu certo...”, lamenta.
Não é só esse o exemplo de caridade de Ratinho e Ivonete. No quintal de sua casa, tem um barroco coberto de plástico, onde mora Cristiano, que no momento da entrevista estava no trabalho. “Cristiano estava sem lugar pra ficar, dormiu aqui na sala uns dias e eu dei esse pedaço pra ele fazer a cabaninha. Ele esquenta a água na lata, usa o nosso banheiro e aí na casinha, ele faz a comida dele, dorme, sai cedo pra trabalhar e só chega à tarde e ele me dá uma ajudinha quando recebe”.
Aí está, amigos, uma história verdadeira do 'Bom Samaritano' às avessas. Nos evangelhos, o bom Samaritano é um homem rico. Aqui ele é pobre ao extremo. Mesmo assim dá o pouco que tem. Quem puder ajudar o casal, o endereço é rua Assyncrito Natal, 360, bairro João XXIII.