Heigorina Cunha (16/04/1923) filha de José Ataliba José da Cunha e Eurídice Milta (Dona Sinhazinha) nasceu num lar espírita e preservou para sempre a herança deixada pelo tio, Eurípedes Barsanulfo, que não conheceu em vida, mas que herdou da mãe, sua ajudante direta, as lições do irmão. Heigorina lembrava bem de sua mãe conciliar os cuidados com os 15 filhos, sendo 12 de sangue e três do coração, com os trabalhos da Casa Espírita ao lado dos demais familiares, construindo inclusive a Vila Sinhazinha, no bairro João XXIII.
Heigorina contava com um ano e quatro meses, quando se tornou uma das vítimas da poliomielite (paralisia infantil), época em que não havia cura e sequer tratamento, e sobreviveu, pela ajuda da mãe, mas por certo, muito mais, pela vontade espiritual e divina.
Assim a menina crescia e, logo a mãe, como terapia, ensinou-a a fazer tricô e roupinhas de criança, tudo costurado a mão. O pai, Sr. Ataliba, comprou-lhe então uma máquina de costura de manivela e pedal e que serviu para desenvolvimento das pernas, sobretudo a esquerda que ficara paralítica. E mais e mais roupinhas ela fazia. A tradição de confeccionar enxovaizinhos de bebê perdurou por mais de 80 anos. E hoje tem sua continuidade por mãos de voluntárias.
Como não podia freqüentar a escola, Heigorina aprendeu em casa as primeiras letras com o Prof. Antenor Germano e, só aos 14 anos, foi para a escola, a antiga Escola Normal, hoje, Coronel José Afonso de Almeida, onde concluiu os estudos com o curso Normal.
Por conseqüência da paralisia, Heigorina se submeteu a vários tratamentos e cirurgias, o primeiro deles, em São Paulo, por quase um ano, devido a um estrangulamento da bacia através da cabeça do fêmur. Novas cirurgias foram feitas em Uberaba, Ribeirão Preto, mas os médicos nunca deram esperanças de que voltaria a movimentar e sequer dobrar a perna esquerda. Ledo engano. Heigorina não só mexeu a perna como passou a andar de muletas e bengala e por um curto espaço de tempo chegou a andar livremente sem apoio, voltando mais tarde ao uso da bengala. A cadeira de rodas só veio na velhice adiantada.
Bem jovem ainda, com vinte e poucos anos, de repente, Heigorina começou a fazer massagens em crianças com paralisia, como aquelas que ela recebia nos hospitais com água quente. Tudo era feito numa mesa forrada por um cobertor, numa das salas da casa, confeccionando ainda para as crianças, botinhas ortopédicas de papelão. Da sala de sua casa, passou depois para o Quartinho de Eurípedes, construído por ela, com material retirado de parte da antiga Casa Mogico, onde morou Eurípedes Barsanulfo.
Logo, Heigorina passou a acalentar um sonho: o de construir um hospital de reabilitação. Para a família, no Quartinho de Eurípedes nasceu a Casa Assistencial 'Dr. Bezerra de Menezes. Nessa mesma época, Heigorina começou a manifestar os primeiros sinais de espiritualidade. E uma mediunidade imensa.
Mas, Heigorina não se contentou só com a massagem nas crianças, ensinava também o braile. E começou com o jovem Eurícles que perdera a visão e, depois vieram outros alunos: João Barbosa (Carteiro); Olavo Wilson; as irmãs, Luíza e Candinha... E muitos outros passaram pelo Quartinho, que ora era sala de fisioterapia, ora instituto de cegos.
Em 1961 assumiu o Culto das Nove, iniciado por Eurípedes Barsanulfo, em 1904, que depois de sua morte ficou sob a orientação de sua mãe, Vó Meca; a partir de 1952, após a morte de Vó Meca, a mãe de Heigorina, Da. Sinhazinha, assumiu o culto, até 1961, ano de seu falecimento. A partir desta data, coube a Heigorina dirigi-lo, trazendo a Sacramento dezenas de caravanas de várias partes do Brasil, para participar de suas preces e pregações, sobretudo nos finais de semana e feriados. Foram mais de 50 anos de presença, participação e mensagens nos cultos até os últimos dias do mês de julho.
Nesse tempo, Heigorina cativou pessoas de todos os status, de grandes personalidades ao mais humildes; de artistas a políticos influentes; de leigos a religiosos e dirigentes de outros credos, todos manifestando o mais profundo reconhecimento e respeito pela sua obra de caridade. Para todos Heigorina tinha sempre um sorriso amável, palavras de conforto, amizade e na maioria das vezes uma folhinha de malva.
Na sua santa humildade, Heigorina enxergava a vida como um aprendizado permanente. “A vida para mim é um aprendizado sem fim, na vida real e na vida espiritual”, disse em entrevista ao ET, em abril último, quando completou 90 anos.
No final deste resumo biográfico, podemos afirmar que Sacramento se orgulha da menina que amanheceu um dia com a febre da poliomielite à menina que começou costurando roupinhas; à jovem que fazia massagens nas crianças e ensinava o braile; à construtora de um hospital para portadores de deficiência; à mulher mais caridosa de Sacramento... Mulher cheia de simplicidade e de espírito humilde, lembramos uma de suas respostas à entrevista citada. “Aos 90 anos, podemos chamá-la de 'Madre Tereza de Sacramento?'” Na sua simplicidade evangélica, respondeu: “Não, jamais. Madre Tereza é uma estrela de Amor. Agradeço o carinho que vocês têm para comigo, mas vou me esforçar, para ser a 'tia Heigorina' de meus conterrâneos”.
Da grande prole de Ataliba José da Cunha e Sinhazinha, restam vivos, Leonie (91), Nizinha (86), Ionete (80) e Maria (67), mas um grande número de descendentes e seguidores da Casa, que darão continuidade ao trabalho a que Heigorina se dedicou por tantos anos com total doação.
Heigorina ao longo de sua vida recebeu várias homenagens na cidade, como a Comenda da Ordem de Nossa Senhora do Patrocínio do Santíssimo Sacramento, a maior honraria do município, outorgada pelo então prefeito José Alberto Bernardes Borges; o Troféu OAB Mulher; Moção de Congratulação, por indicação do vereador Cleber Rosa da Cunha.
O decreto nº 389/13, assinado pelo prefeito Bruno Scalon Cordeiro, marcou o luto oficial de três dias, com bandeira hasteada a meio mastro. Por motivo do decreto oficial de luto, a reunião ordinária da Câmara, que acontece às segundas-feiras, foi cancelada, conforme o Regimento Interno, artigo 125, parágrafo 2º.
Destaque para as bandeiras do Brasil, Minas Gerais e Sacramento, que a meio mastro tremularam na praça Dr. José Zago Filho, próximo à chácara Triângulo, onde se realizou o velório e por onde passaria o cortejo fúnebre. Uma merecida homenagem àquela que deu tudo de si em prol de seu semelhante.