"Um monumento,
É essa a definição mais exata de nosso pai – um monumento de ternura, de sabedoria, de retidão, de fé, de coragem, de humildade. Um monumento que não tomba nunca, porque no céu se eternizou em Deus, e na terra, deixou um imenso legado de amor.
No longínquo 15 de agosto de 1912 ele veio ao mundo, numa casa humilde do Areão, já abençoado pelo dia consagrado a Maria, Mãe de Deus, a quem haveria de honrar pela vida toda. “Eu sou congregado mariano, sou soldado de Nossa Senhora”, costumava repetir. Norteou sua vida religiosa pelo amor à Igreja, na devoção a Maria e a Santo Antônio de Pádua, seu companheiro inseparável. Recebeu um nome forte – Miguel – e transformou-se num anjo na terra, que semeava a paz e anunciava Deus onde estava e por onde passava.
Foi arrimo de família muito cedo, zelou do pai até sua morte, cuidou carinhosamente da mãe viúva, da irmã caçula, do sobrinho órfão. Depois Deus lhe deu um prêmio precioso: o amor de nossa mãe Naná. Só quem conviveu com esse casal tem a aproximada dimensão da profundidade do amor que os uniu. Todos os dias mamãe recebia uma flor de suas mãos e lhe retribuía com um beijo e um sorriso. Nunca presenciamos uma briga entre eles, nem sequer uma palavra mais áspera. O carinho, a cumplicidade, a cooperação, o respeito, a alegria, a fidelidade e a paz - isto foi tudo o que nos ficou na memória daquela convivência exemplar que compartilhamos. Nos momentos difíceis de aflição, eles se amparavam, se consolavam, rezavam juntos e se alimentavam de esperança, sem se deixar abater.
Daquela união sublime, nascemos, os dez filhos: Jacob, Leila, Isaac, Amir, Saula, Saulo, Zaira e Munir (Ana Maria e Manoel morreram com poucos dias de vida). A prole numerosa era o orgulho de Seu Miguel e Dona Naná, pelo que eles só agradeciam a Deus, sem nunca reclamar do trabalho e dos sacrifícios que lhes impusemos.
Sensível à dor alheia, misericordioso e generoso, nosso pai foi o exemplo vivo e límpido da caridade cristã. Nunca tivemos notícia de uma agressão sua a quem quer que seja. Na sua simplicidade, detinha o discernimento dos sábios, a franqueza dos puros, a integridade dos justos. Nossa casa ficou conhecida como “a casa da porta aberta”. Era a casa do Seu Miguel, lugar onde desvalidos, bêbados, doentes, abandonados e discriminados encontravam abrigo e paz.
Viveu 82 anos de pura bênção. Morreu em 22 de novembro de 1994 na serenidade de quem só amou na vida. Deixou uma saudade enorme, ensinamentos e exemplos valiosos que vão se perenizar nas gerações que o seguem, e uma certeza: a de que habita o lugar dos justos, a Casa do Pai. E lá, junto com a mamãe, recebeu nosso irmão querido, o Saulo, que se foi no ano passado juntar-se a eles.
Obrigado, Pai do Céu, pelo pai que nos destes na terra!”
A. S. J.