Essa é uma das muitas histórias dignas de folhetim e fonte para uma boa novela. A história poderia começar assim:“Era uma vez um homem chamado Ivo Rodrigues...”, ou “Na distante cidade de Casa Nova (BA) havia um homem chamado Ivo Rodrigues...”, ou ainda: “Ivo Rodrigues e Ana, dois jovens apaixonados...”. Mas optamos pela retrospectiva, a partir dos anos 60...
Ivo Rodrigues saiu da cidade de Casa Nova, na Bahia, no ano de 1958. Depois de passar um tempo em Igarapava, chegou a Sacramento em 1960. Logo conheceu Ana Tereza Pereira e, após o namoro, em 1962, no dia 14 de outubro, casaram-se e mudaram para Jussara (GO), onde residiram por três anos.
Em Jussara, nasceram os filhos Antônio, falecido e, Luiz Carlos, mas os registros foram feitos em Sacramento, onde nasceram os outros nove filhos do casal: Alaerte, Reginaldo (Lurdes), Eurílio (Cidinha), Eurípedes, Ivete (José), Geovana (Ademir) e a caçula Beatriz (Eurípedes); os filhos Iron, Joel e Antônio são falecidos. Ana Tereza tem 23 netos e 12 bisnetos.
Após 16 anos de casados, Ivo Rodrigues abandonou a esposa Ana com dez filhos e um na barriga, a caçula Beatriz. Em um dia do ano de 1980 chega a notícia de que Ivo suicidara-se, no dia 14 de outubro, em Conceição das Alagoas (MG), onde morava. O filho Luiz Carlos foi àquela cidade e deu-lhe um enterro digno, apesar de já passados quatro dias de sua morte, que ocorreu no mesmo dia de seu aniversário, quando completava 45 anos e data também do aniversário de casamento com Ana.
No início deste ano, Luiz Carlos, 46, casado com Margarida e pai de quatro filhos, decidiu conhecer os avós paternos e seus tios. “Meu pai falava que tinha um irmão, Antonio Rodrigues, que morava em Igarapava, mas nunca tivemos contato. Falava de meus avós Agapito e Maria da Conceição, conhecida por Miudinha. Só que nunca procuramos, não sabíamos onde encontrá-los. Agora, no início do ano, decidi procurar a família de meu pai, porque não conhecemos ninguém”, explica Luiz, que não mediu esforços. “Entrei em contato com a prefeitura de Casa Nova, expliquei a situação e eles disseram que iriam colocar na rádio da cidade”, conta.
O contato de Luiz Carlos com a prefeitura de Casa Nova foi no mês de fevereiro e qual não foi a sua surpresa, ao receber uma ligação de São Paulo, na última quinta-feira, 12. “Recebi um telefonema de um tal Joel Rodrigues, de São Paulo, me perguntando se eu era o pai dele, Ivo Rodrigues. Aí eu lhe disse que Ivo Rodrigues era o meu pai. Qual não foi minha surpresa quando ele disse que Ivo Rodrigues era também o pai dele e que tinha uma irmã de nome Ivete”, conta mais Luiz Carlos, ainda surpreso com tudo o que aconteceu.
Conversa vai, conversa vem, Joel ficou também sabendo que tinha outros nove irmãos, dos quais, dois, com os mesmos nomes, dos primogênitos de Ivo: Joel e Ivete. Ambos, então, descobriram também que tinham os mesmos avós, o famoso Agapito e Miudinha, pais de Ivo Rodrigues, que primeiro abandonou Joel e Ivete na Bahia, prá constituir em Sacramento uma nova família.
“- Aí fomos descobrir que meu pai era casado lá, abandonou a família e sumiu no mundo, nunca mais deu noticiais. O Joel tinha pouco mais de um ano e Ivete não era nascida. Meu pai não a conheceu. Aí foi muita emoção. Foi muito choro. Reunimos todos , na sexta-feira , para conversar pela internet e foi um choro só. E o Joel disse me disse: 'Estamos indo pra Sacramento amanhã (sábado, 14). Aí a ansiedade foi grande, porque o sábado não chegava”, contou mais, emocionado com a chegada dos irmãos Joel e Ivete.
A partir daí, Luiz Carlos foi descobrindo outros parentes, como Maria Aparecida, esposa do Antônio (irmão de Ivo) e quatro primos, residentes em Araminas. A avó Miudinha, com 98 anos, ainda reside na Bahia. “Foi muito emocionante. Eu estava procurando um tio, e meus avós e encontro dois irmãos. Nunca fui à Bahia, nunca pensei em ir lá, mas agora tenho minha avó com 98 anos. Ela mora num lugar chamado Piçarrão, perto de Sobradinho, na divisa com Petrolina (PE). O interessante é que meu pai ficava às vezes pensativo, suspirando. Ele era um homem triste. Ele dizia que tinha um sobrinho de nome Joel, filho de uma irmã adotiva, chamada Maria, que morava com o avô. E ele, quando dizia isso, estava se referindo ao seu filho e à mulher, mas nunca contou a verdade. Acho que ele não sabia que a mulher dele estava grávida, porque nunca falou dessa outra filha da irmã, na verdade, sua esposa, a vó Miúda, que ele dizia ser uma irmã adotiva”.
Joel Rodrigues, 54, e Ivete, 52, logo que descobriu mais oito irmãos em Sacramento, trataram logo de sair de São Paulo e vir conhecê-los. E o sábado, 14, foi de emoção na casa de Luiz Carlos, quando ele reuniu toda a irmandade para conhecer os novos irmãos, que chegaram às 13h00.
A família de Ivo na Bahia
O motorista, Joel da Costa Rodrigues, 54, que reside hoje em São Paulo e foi criado pela mãe e os avós maternos, durante muitos anos, vinha procurando pelo pai, Ivo Rodrigues. “Papai saiu de casa eu era ainda muito criança, dois anos, não o conheci e mamãe estava grávida. Ele nunca mais deu notícia, exceto uma vez, em 1961 ou 1962, que meu tio escreveu dizendo que ele trabalhava na Usina Junqueira. Há muitos anos eu queria encontrá-lo”, conta.
Na versão de Joel, depois que a prefeitura de Casa Nova veiculou o aviso de Luiz Carlos na rádio, um primo seu ouviu e ligou para ele em São Paulo, afirmando que o seu pai estaria procurando pelos parentes. “Na hora, liguei pra rádio e eles me informaram que, na verdade, era um filho do Ivo, meu pai, que procurava pelos avós. Mas eu pensei que seria de fato meu pai, como meu primo falou. Porque, eu sou filho de Ivo Rodrigues, neto de Agapito e Maria da Conceição, conhecida por Miudinha. O pessoal da rádio me deu o telefone do Luiz, aqui em Sacramento e eu liguei”, conta emocionado.
A conversa no telefone, entre emoção, ansiedade, surpresa e choro acabou revelando que Joel e Luiz Carlos eram irmãos, filho de Ivo Rodrigues. “Quando nós identificamos os avós e eu falei que era filho de Ivo Rodrigues, aí Luiz perguntou: “Como você é filho de Ivo Rodrigues? Ele é meu pai”. Eu respondi: 'Eu é que sou filho de Ivo'. Maria da Costa Rodrigues é a minha mãe, casada com Ivo Rodrigues. Aí caiu a ficha... Como o Luiz não sabia da existência da gente, nós também não sabíamos da deles aqui. Nem minha tia (mulher do tio Antônio) sabia do meu pai. Não sabia que ele tinha outra família, nem que havia falecido”, conta.
De acordo com Joel, quando o pai saiu de casa, ele tinha pouco mais de um ano. “Ele nunca viu minha irmã. Não conhecemos nosso pai. Fomos morar com meu avô Agapito, mas depois meu avô, Modesto, pai da mamãe, nos levou para a sua casa e lá fomos criados”, diz, reafirmando: “Mas eu sempre quis encontrar meu pai, vivia procurando, nunca perdi a esperança de ter pelo menos notícias, porque ele ficou no mundo sozinho”, disse.
Participando e confirmando tudo o que irmão, Joel, contava, Maria Ivete, 52, hoje, viúva e mãe de uma filha de 18 anos, com um sorriso cativante, confirmando toda a história, era pura satisfação. “Fiquei muito feliz ao descobrir esses irmãos, sobrinhos. A família cresceu de repente. É muita felicidade”, afirmou, dando uma boa risada.
Elizabete da Silva Rodrigues, esposa de Joel, conta que, quando o marido soube dos irmãos “ficou louco”. “Há mais de 30 anos, ele procura o pai. Mas nunca imaginava que teria mais irmãos, até receber um telefonema de um primo da Bahia. Depois que ele conversou com o Luiz ficou louco, louquinho, chorou demais e disse: 'Vamos pra Minas. E ele não agüentava de ansiedade. A gente nem sabia da cidade de Sacramento e saímos de São Paulo de madrugada e quando chegou aqui foi aquela emoção”, disse.
Ana Tereza Rodrigues, a mulher sacramentana de Ivo Rodrigues, se confessou também surpresa com a notícia, mas não escondeu o contentamento. “Foi muita surpresa, mas a gente fica alegre, feliz em ver esse encontro. Mas eu nunca imaginei que ele teria outra família. Ele devia ter contado e deveria ter ido ver os filhos, a família”, ponderou, conformada.
Mas a vida de Joel e Ivete tem muito mais coisas parecidas com a dos irmãos: as dificuldades. “Passamos muitas dificuldades, mamãe trabalhou muito, eu era menino e pescava no rio São Francisco, ajudava meu avô nas lavouras de milho e mandioca que ele plantava na beira do rio, tudo pra gente sobreviver. Mas vencemos.
A vida dos irmãos Joel e Ivete em São Paulo
Dos 17 para os 18 anos , conheci uma pessoa e decidi vir para São Paulo pra ajudar a família. Aí sim, que minha vida ficou mais dura. Aliás, eu tive tudo pra virar bandido em São Paulo, porém vim com as lições do meu avô Agapito que um dia disse: “Filho, você vai pra São Paulo, para a terra dos outros. Passe fome e frio, mas ande sempre no bom caminho. Se tiver fome, peça. Se baterem a porta na sua cara, bata na outra e nunca pegue o que não é seu”, recordou.
Segundo Joel, não é difícil se tornar um bandido em uma cidade como São Paulo. “Mas eu não escolhi essa vida. Ingressei numa empresa de tecelagem, lá eu trabalhava, dormia, comia. Em 1975 casei-me com Elizabeth. A tecelagem fechou e, quando o nosso filho, Edgar, 30, estava com seis meses, em 1980, ingressei noutra empresa, um fábrica de auto-peças para montadoras de veículos , onde me aposentei, mas ainda continuo trabalhando na empresa, como motorista. Sou um vencedor e agora vem essa alegria de encontrar mais nove irmãos e sobrinhos. Mamãe mora em São Paulo, conosco. Minha avó, Miuda, nunca quis vir pra São Paulo, mora sozinha, mas há uma senhora que cuida dela. Ela diz que quer morrer lá...”
Para Ana Tereza, mulher sacramentana de Ivo, criar os nove filhos também não foi fácil. “Quando o Ivo foi embora, eu estava grávida da Bia e a vida foi difícil, muito difícil, eram dez filhos pequenos. O Luiz Carlos era o mais velho dos vivos, tinha 14 anos. foi uma luta muito grande a nossa vida...”, recordou.
Joel e Ivete trouxeram inúmeras fotos do pai, dos avós e demais parentes na Bahia e agora todos pensam em ir à Bahia conhecer a avó Miudinha e vão precisar de um ônibus, porque a família é grande: oito netos, 23 bisnetos, 12 trinetos, Joel, a esposa Bete e o filho Edgard, Maria Ivete e filha Beatriz. Se forem os genros e noras o ônibus não cabe.