Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

Entrevista: Padre Alfredo Vieira - ‘Angola continua um país complicado...

Edição nº 1607 - 26 de Janeiro de 2018

Os irmãos padres, Dionísio e Antônio José Foltran Zamuner, o primeiro do Seminário de Tietê (SP); o segundo da diocese de Rubiataba (GO), estiveram em Sacramento no último final de semana, acompanhados do angolano, Pe. Alfredo Vieira 54, na sua terceira visita ao Brasil, todos redentoristas, daí a visita à cidade, onde a congregação permanece desde 1959, na fundação do Seminário do Santíssimo Redentor; administrando a Paróquia de Na. Sra. do Patrocínio de Sacramento e agora no Centro de Assistência Social (CAS) Pe. Antônio Borges de Souza.  Entre amigos, durante um café da tarde, Pe. Vieira falou ao ET sobre o trabalho dos redentoristas na cidade.

Natural de Bié, província de Angola, filho de pai angolano e mãe portuguesa, Pe. Vieira é o único sacerdote entre quatro irmãos. O mais velho Apolínário é jurista, residente em Cabo Verde; Manuela é psicóloga em Portugal e Manuel também residente em Portugal. De formação redentorista, Padre Vieira trabalha em Angola, na formação de seminaristas e é professor de Sociologia, na Faculdade de Ciências Sociais de Luanda. Entre perguntas dos amigos e respostas de Pe. Vieira, veja alguns temas levantados.

 

País entra numa nova fase

Para Pe. Vieira Angola continua um país complicado. “Estamos na virada. Tivemos um único presidente durante 38 anos no poder e agora começa uma nova etapa. Uma nova fase, que começou em setembro com a posse de João Lourenço, portanto, ainda é muito cedo para fazermos avaliações”.

 

Os redentoristas em Angola

O papel da Congregação Redentorista, conforme padre Alfredo é a promoção humana e missionária. “Trabalhamos nas dioceses, pastorais e na promoção humana da população. As vocações são razoáveis. No ano passado tivemos apenas 11 seminaristas na formação de Filosofia. A Teologia e noviciado eles fazem em Burkina Faso, país africano de língua francesa. Este ano, teremos 14 alunos no curso de Filosofia”, informa, justificando a formação em outro país. “Essa é uma opção da Congregação, em Angola. Fazer a formação internacional quando se chega na Teologia e noviciado. Na África temos dois grandes   noviciados   estamos no Burkina Faso, mas temos também uma casa no Zimbábue”, explica, lembrando que essa modalidade chega também à américa Latina.

 “- A congregação no Brasil está recebendo seminaristas da América Latina para o noviciado. A partir de agora, vamos receber seminaristas paraguaios, bolivianos, que virão para Tietê. Este ano temos dois noviciados da América. No Brasil temos duas casas de formação de noviciado e assim como em Angola, os jovens vão para outro país, a Congregação vem adotando o mesmo sistema na América”.

 

A relação entre Brasil e África 

“O Brasil é rico em províncias e vice-províncias, ao o contrário de Angola. Nós somos só uma vice-província, com 29 confrades para todo o país.  E vejam que a Congregação Redentorista chegou a Angola em 1954 e a presença brasileira redentorista no país, já foi maior. Tivemos já uma participação muito grande, que marcou época, aliás, o que a nossa vice-província de Angola é hoje, devemos ao Brasil, especialmente, à província de São Paulo, mas hoje, infelizmente, só temos um padre de São Paulo, Pe. Edcarlos. Temos também um padre vietnamita e um português, os demais somos todos angolanos”. 

 

Catolicismo é predominante

Colonizado por Portugal, Angola tem no Catolicismo a sua religião principal. “A religião católica é a número 1 no país. Ela é predominante, mas as estatísticas mostram que está diminuindo. Estamos perdendo fiéis para   igrejas evangélicas, seitas diversas e até os mulçumanos que chegaram na década de 90”, reconhece. 

Participando da conversa, Pe. Dionísio, que permaneceu em Angola por longos 20 anos, lembra que em 1997, quando lá trabalhava, estavam iniciando a construção da primeira mesquita. E Pe. Vieira completa: “Com a nova abertura, o mundo globalizado e tentativas de processos de paz pelas Nações Unidas, muitos angolanos vão aderindo a novas religiões. 

 

A expressão cultural na religião 

De acordo com Pe. Vieira, a região é rica em línguas nativas (autóctones), dialetos, mas não atrapalham a religiosidade. “O Cristianismo é muito enraizado, é a religião cultural de Angola. Eu disse que o catolicismo está caindo, mas o Cristianismo é crescente, mais de 90% da população é cristã. Agora, quanto aos idiomas, temos não só as línguas nativas, dialetos, como até línguas internacionais, não só em Angola que tem como língua oficial o português, mas também nos países vizinhos. Angola tem cerca de 11 línguas e dialetos”.

Pe. Dionísio reforça essa expressiva expressão cultural do país e questiona se isso depende da Igreja Romana, ao que Pe. Vieira responde: “Somos católicos e queremos continuar a ser católicos, mas com a nossa identidade, então é claro que o Catolicismo angolano tem, sim, nossa expressão cultural. A Igreja Católica dá abertura para isso e temos uma expressão cultural, diria que, muito forte. Nossa liturgia tem aspectos bem particulares, música, dança, isso ajuda na evangelização. Liturgia é vida e vida do povo, afirma ressaltando a duração das celebrações. 

“- As minhas celebrações duram 1h15, no máximo, porque celebro em várias igrejas, mas a maioria das missas, as celebrações assistidas, podem durar até quatro horas, dependendo da expressão cultural. Mas isso não é só lá, acontece no mundo todo, inclusive, no Brasil. Na Europa, já participei de missa que durou três horas. Missas animadas, são missas para a vida, para a expressão do povo”.

 

Clero angolano, conservador ou progressista

Para Pe. Vieira é difícil explicar isso, por ser uma questão pessoal e de formação. “Depende dos conceitos que se tem, alguns são mais arrojados, outros mais aventureiros, é igual ao clero em todo o mundo, uns conservadores, outros progressistas. Os redentoristas são redentoristas com um carisma diferente, mas há conservadores e progressistas, embora o nosso papa pregue muito essa abertura da Igreja em busca do povo de Deus. O nosso Papa é o Papa do momento, com uma mensagem encarnada e que cumpre a exata missão que o mundo pede e temos que seguir isso, como povo e pelo povo”.

 

Visitas ao Brasil

É sua terceira visita ao Brasil, um país que aprendeu a gostar pelos laços históricos que ligam Angola, Portugal e Brasil e pelos confrades redentoristas. Mas, especialmente desta vez, veio para tratamento de saúde. Amigo dos irmãos Zamuner, tendo sido, inclusive aluno de Pe. Dionísio, no seminário, em Angola, Pe. Vieira faz sempre uma boa avaliação do Brasil. “Estou muito feliz, muito feliz, gosto muito do Brasil e agora, vir a Sacramento pela primeira vez, mais ainda por conhecer novas pessoas e novas amizades. Isso são momentos de partilha, de novos conhecimentos”, finalizou.