A economiária Patrícia Pavanelli Araujo Alves está curtindo a merecida aposentadoria, após 30 anos de serviços. O dia 23 de maio ficará gravado na história dessa sacramentana, filha do Seu Gilberto e da Da. Nenzinha... cujo trabalho agora, pelo menos nos próximos meses diz ela, é cuidar do marido, Jamir, e do filhão, Renato, 22. “Primeiro vou absorver esta aposentadoria, sentir o gosto de ficar em casa, de passear sem as preocupações profissionais. Depois, vou ver... Deixe o tempo decidir”, disse Patrícia em uma gostosa entrevista entremeada com um farto café da tarde, ao lado do simpático Jamir.
ET - Patrícia, quem nasceu primeiro em Sacramento, a Caixa ou você?
Patrícia – Na verdade, nossas histórias se confundem. Mas a Caixa chegou um pouquinho antes, falando de minha vida profissional. Eu fiz concurso para o Banco do Brasil, mas não fui aprovada, a parte de Contabilidade foi muito puxada e eu tinha feito Magistério.
ET - Pudera! Tinha a quem puxar... (risos).
Patrícia - Então, imaginem, filha de Nenzinha, sobrinha da Adail e da tia Cicy (Araçy Pavanelli), eu tinha que ser professora... E cheguei a fazer o Curso Normal. Mas nunca me interessei pelo magistério. Comecei trabalhando com papai na loja dele e, depois, fui supervisora do IBGE, em 1980, um tempo que incorporei em minha aposentadoria. Prestei o concurso do Banco do Brasil, saí bem em todas as matérias, exceto uma, a Contabilidade, que nunca tinha visto, me reprovou.
ET - E como aconteceu sua entrada na Caixa?
Patrícia – Ah, essa foi muito interessante... Coisa, sei lá, do destino e do Seu Gilberto! Comecei a ter dores de cabeça e papai me levou a Uberaba para me consultar com um oftalmologista. Naquela cidade, nós nos encontramos com o Roberto Santana, que trabalhava comigo no IBGE, que me perguntou se eu havia feito a inscrição para o concurso da Caixa. E eu nem sabia do concurso. Aquele era o último dia para as inscrições. Papai e eu corremos para o banco. Chegamos, o expediente estava encerrado, mas havia gente lá dentro. Papai conversou com o vigilante, pediu... Teve até uma mentirinha de pneu furado... (risos). Comovido, ele nos deixou entrar. Sorte que eu estava com todos os documentos, só faltava o comprovante de conclusão do segundo grau, mas aí mostrei a carteirinha da faculdade e valeu. Inscrevi-me e me dei bem, graças a Deus. A Caixa começou a funcionar em 1981, em outubro de 1982 comecei a trabalhar.
ET - E o Santana?
Patrícia - Ele não passou, mas conseguiu um ótimo emprego na Unifran, onde está até hoje.
ET - E como foi sua trajetória na Caixa... Começou fazendo o quê?
Patrícia - Sou do tempo do balcão. Naquela época, todo mundo começava, como dizíamos, 'raspando a barriga no balcão'. E era um tempo que muita gente lembra bem, descontava cheques e fazia depósitos 'no' caixa, com os formulários preenchidos no balcão. Eram filas pra tudo, aliás as filas nunca acabaram. E toda a papelada era feita a mão, tudo, tudo... Naquela época, o rendimento da poupança era no dia 1º de cada mês, aí chegavam os 'slips',uns papeizinhos que vinham e a gente tinha que cortar todos e colocar um por um nos envelopes dos clientes. Nas contas corrente, tínhamos que fazer anotações de depósitos e retiradas, as contas tinham que ser atualizadas, tudo manual. E mais, eu sou operadora de telex! Fiz curso. Lá na Caixa consta isso. (Risos).
ET – Você usava o código Morse?
Patrícia – Oh!! Nem tanto, né?!!! (risos) Era teclado, como das antigas máquinas de escrever. E tudo era enviado e recebido através de telex, balancetes, movimento do dia, as instruções, tudo via telex. Quando começaram aqueles planos econômicos, chegavam metros e metros de folhas no telex. Era a noite inteira pra receber, chegava no outro dia e lá estavam metros de folhas. Tínhamos que ler aquilo e pôr em prática. Acho que os mais novos, nem sabem o que é telex. E as máquinas registradoras, imensas, pesadas... Mas aí mudei de função. Saí do balcão e fui trabalhar na Habitação, surgiu uma vaga com a transferência de uma colega e a Divina me chamou para o setor. E ali eram informações e mais informações...
ET - Naquele tempo a Caixa já operava com algum projeto de habitação na cidade?
Patrícia – Sim, foi na época em que o Sr. Isídio Rosa lançou o primeiro loteamento da cidade, o Residencial Maria Rosa, que se transformou mais tarde no bairro. Eu fiz boa parte daqueles financiamentos sozinha, tudo manual. A Caixa funcionava onde é hoje a loja Lacerda Calçados. Como o espaço ficou pequeno, a Caixa alugou a parte de cima do Salão Paroquial para atender as pessoas. E era um processo demorado, tudo manual... Eu ficava até dez horas da noite trabalhando com aqueles papeis, sábado, domingo. Foi muito trabalho. Era um processo complicado. Hoje, o sistema de financiamento habitacional mudou muito, é muito mais fácil e relativamente rápido. Eu vivi dentro da Caixa também a evolução tecnológica...
ET – Você viveu nesses quase 30 anos de Caixa uma evolução tecnológica muito grande...
Patrícia – Sem dúvida! Uma grande evolução. Da carteira de habitação passei à Caixa, entre abril de 1987 a dezembro de 1990, quando fui promovida à Supervisora, cargo que ocupei até 1995. Na época, éramos dois supervisores, o José Antônio e eu, aí houve uma mudança e passou a ser apenas um Supervisor, foi quando retornei como Caixa, em janeiro de 1996, onde permaneci até setembro de 2010. Quando entrei com o pedido de aposentadoria, pedi pra sair, eu já estava muito cansada, pois é uma função muito desgastante.
ET - Exige uma atenção constante, se não leva prejuízo e você é responsável. Já aconteceu de você pagar por algum prejuízo de diferença?
Patrícia - É verdade, temos que ser rápidos, eficientes e atenciosos. Uma bobeira e dançamos. Aconteceu comigo uma vez. No final do dia uma diferença de R$ 2 mil. Paguei a mais a uma cliente, mas que demonstrou dignidade. Percebeu a diferença e retornou à Caixa para me devolver, a Da. Aparecida Bonatti.
ET - Pelo fato de ser uma função desgastante, você tirou, por essa conta do stress, muitas licenças?
Patrícia - Não. Apenas uma durante todo esse tempo. Foi para fazer uma cirurgia no ombro. Mas além do atendimento no balcão, habitação e caixa executivo, eu executei muitas outras tarefas: preparação e encaminhamento de documentos via malote, abertura de contas, empréstimos a pessoas física e jurídica, compensação, substituição de gerência e, por fim, atendimento geral.
ET - E qual é o segredo de ocupar uma função dessas, por mais de 20 anos e sempre alegre, solícita e atenciosa com os clientes? Aliás, por essa conta é que te dedicamos o título, 'Patrícia, a funcionária nota 10'.
Patrícia - Fico muito honrada. Muito obrigada! Sempre tive comigo que trabalhar com pessoas exige isso da gente. Não podemos deixar que os problemas pessoais, problemas de casa nos afetem no trabalho. Todos temos problemas e não foi diferente comigo, mas as pessoas que nos rodeiam merecem o melhor de nós, por isso eu sempre fiz questão de, o máximo que conseguisse, dedicar-me no melhor possível aos outros. Se a gente deixar nossos problemas refletirem nos outros, as coisas complicam, por isso sempre estive alegre, brincalhona, com uma piadinha para os colegas, sempre de bom humor.
ET – Aliás, o ET conversou com alguns funcionários e todos são unânimes em afirmar o seu profissionalismo e seu bom humor com a vida... Seu relacionamento atrás do balcão também foi sempre legal?
Patrícia – Sempre. Tratei todos dentro da Caixa como um igual. Nunca fiz distinção entre faxineira, vigilante, telefonista, aprendizes, gerente ou quem quer que fosse. Sempre me relacionei muito bem com todos, sempre distribuindo sorrisos, alegria... E graças a Deus recebi muitos elogios por isso. Inclusive pessoas que trabalharam na Caixa e que moram ou trabalham fora, mesmo em outras atividades, sempre que vinham a Sacramento passavam por lá para me dar um abraço. Não é maravilhoso isso? Acho que eu posso contabilizar um saldo positivo nesses anos de Caixa...
ET - Você conquistou tanto os clientes que tinha até os preferenciais...
Patricia - É engraçado, clientes preferenciais. Eu não tinha clientes preferenciais. Eles é que me escolhiam (risos). Havia clientes que faziam questão de serem atendidos por mim. O Sr. Alcebiádes Scalon, por exemplo, entrava no banco e já gritava “Patrícia!!!” (risos). No começo todo mundo ria. Ele gritava meu nome e ia ao guichê 'do' caixa para eu atendê-lo. Às vezes, ele ia ao banco até três vezes no dia...
ET - Esse carinho, não te traz saudades?
Patrícia – Muitas! Tenho saudades do General Alberto Cunha, Dona Julieta, Dona Licinha Valadares, Sr. Bijó, Dona Olga Tormin, Aresqui, Eurípedes (irmão da Noélia), Sr. Anardino Monteiro, todos já falecidos, mas que me tratavam com muito carinho e faziam questão de serem atendidos por mim.
ET - Aliás, com o Sr. Anardino, você exagerou no tom de voz...
Patrícia - É verdade! (risos). Foi um caso muito engraçado com o Sr. Anardino. No dia do pagamento dos aposentados, a Caixa disponibilizava um caixa só para eles e eu lá. Eu já falo alto por natureza e aumentava o tom para falar com as pessoas idosas. Um dia, o Sr. Anardino, quase 90 anos, chegou e eu perguntei, bem alto: “E aí Seu Anardino, o que o Sr. está precisando?” E ele rebateu em alto e bom tom: “Tá gritando comigo por quê? Sou velho, mas não sou surdo”. Foi um riso só dentro da Caixa, dos clientes, colegas e eu... Tenho saudade deles... Meu pai... ia todos os dias me ver com um sorriso no rosto. Chegava e dizia: “Deus te abençoe!” Fazia tchau e ia embora. Até que um dia não voltou mais...
ET - O Dr. Lair Ribeiro, médico expert em comunicação, autor de vários livros sobre o assunto, afirma que existem algumas “palavras mágicas” que abrem todas as portas para a boa comunicação com as pessoas. Quais as suas?
Patrícia – Eu me comunico mais com os gestos, minhas palavras são o sorriso, o carinho e a alegria. E me recordo aqui de outros clientes como Dona Celeste, Dona Ayr Loyola, Aparecida Bonatti, Dona Luzia Bandeira, Sr. Odorico Dias, que gostavam de ser atendidos por mim. O atendimento ao público é desgastante, cansativo, mas graças a pessoas especiais, que nos tratam com tanto carinho é que consegui trabalhar todos esses anos. Os colegas de trabalho, desde os mais antigos até os mais novos sempre me trataram com carinho e respeito. Eu só tenho a agradecer muito a todos.