Recordando sua adolescência, no Ginásio da Escola Coronel, ele se define até como um 'Rebelde', por conta, diz ele, de resquícios do período militar. E só 'depois de muito esforço' conseguiu terminar o Técnico em Contabilidade. Era o jovem Samuel Luiz Araújo, filho de Antônio Alves Araújo, o Antônio do Cartório, e de Ieda Darqui Araújo. Aos 12 anos estava com o pai no Cartório e um futuro imenso pela frente. Foi à Faculdade, bacharel em Direito, pós-gradução e agora chega ao doutorado em Direito Internacional. Adora o magistério e se impõe já como um 'grande mestre' em várias instituições e percorre o país fazendo palestras… Tudo isso, sem perder as raízes, continua em Sacramento como “o fazedor de escrituras', no Cartório do 2º Ofício. Vamos à entrevista.
ET – Começamos sempre nossas entrevistas falando da gênese de nossos entrevistados. Então, vamos lá, onde nasceu o Samuel, sua filiação, sua infância, sua escola primária... tudo aquilo que te aconteceu até chegar à Universidade.
Samuel - Nasci e continuo vivendo em Sacramento. O primário e o ginásio cursei na Escola Coronel, assim como parte do então segundo grau. O meu hobby de infância era percorrer todo o quarteirão da minha casa pelos muros. Subia no muro de casa e ia parar lá no Zandonaide, na construção do Paulo etc.
Depois de muito esforço consegui terminar o segundo grau, concluindo o curso Técnico em Contabilidade, pela extinta Escola Municipal Maria Crema. Eu discordava veementemente do sistema, do modo como as situações eram conduzidas. Prefiro pensar que isso era um resquício do período militar, no qual as pessoas agiam conforme as ordens que recebiam, sem possibilidade (ou mesmo o “querer”) de refletir sobre elas. Parecia que usavam tapa-olhos, enxergando somente o que vinha pela frente, sem uma visão panorâmica, o que é indispensável. Na época eu poderia ser tachado de “rebelde”. Esquecendo a modéstia e talvez em tom de desabafo, hoje sou pós-graduado em educação e posso falar disso - além de manter o meu posicionamento - com a autoridade de quem conhece do assunto. O exercício da docência requer inexoravelmente uma visão panorâmica do mundo.
ET – Preparo...
Samuel – Sim, e aproveitando dou uma dica: o professor de geografia não é somente o professor de geografia. É também de português. O mesmo ocorre com o de matemática, física, química, história etc. Teremos resultados positivos quando aplicarmos isso. Um país alcança o desenvolvimento quando tem um povo decentemente instruído e isso se inicia com um corpo docente bem preparado. Daí, parti para o ensino superior. Mas eu queria falar mais sobre escola, pois é um assunto que me atrai. O (mau) professor tem o hábito de apontar deficiência no aluno. Participei de algumas reuniões e vi professores acusando alunos, dizendo que não tinham compromisso, que não estavam interessados e muito mais. É fácil e confortável para o (mau) professor ver o erro no aluno, quando em verdade o erro está nele próprio. O mau professor se conduz dessa maneira. Afinal, reconhecendo os seus erros, ele poderá estar se expondo.
O aluno é (ou está) desinteressado por que o professor é pífio. O grande desafio da docência é trazer o aluno para dentro do contexto, fazê-lo se interessar pela matéria, fazer com que sinta prazer em estar naquela aula. O bom professor consegue isso. É inegavelmente mais fácil acusar o aluno de desinteresse e excluí-lo do contexto do que trazê-lo para dentro dele.
ET – O que se espera desse profissional?
Samuel – Que ele tenha a sensibilidade de compreender qualquer mau momento pelo qual o aluno esteja passando, seja por si, seja por conta de algum problema familiar. Os maus professores dizem: "Mas isso não é problema meu. Eu estou aqui para ensinar e ele para aprender". Aí reside o engano. A arte de ensinar vai muito além do "vomitar" verdades que não são dele, professor. Até porque as verdades postas são mutáveis. Um conhecimento que hoje é verdadeiro pode se tornar obsoleto amanhã. Imagine lecionar biologia na década de 1930 e imagine lecionar a mesma disciplina hoje... E convenhamos: poucos "ensinam". Tem gente que confunde seriedade com taciturnidade, assim como tem gente que privilegia a obtusidade. Isso é lamentável! Não sei como podem acreditar que o bom professor tem de ser bravo, sombrio, aquele que todos temem. O curso de Direito é pródigo desses exemplos. O cara acha que respeitabilidade é ser temido, quando em verdade ele é odiado.
ET – Concluindo, qual seria a tarefa do professor?
Samuel - O professor deve ir mais longe, deve procurar inserir o aluno e não o afastar da sala. Devemos nos lembrar que a escola faz parte do contexto social e que a transmissão (ou divisão, segundo alguns pensadores) do conhecimento é infinita, não encontra barreiras. Portanto, a escola não é somente o local em que se "ensina" português, matemática, física, química etc. Ela deve procurar ensinar o aluno a viver, isto é, a se inserir no contexto social, e na falta de uma estrutura adequada (alguns se arrimam nisso), isso é sim tarefa do professor. Sempre insisto no preparo intelectual e cultural. Acredito que pouquíssimos professores acessam as bibliotecas virtuais para saber o que se está pesquisando na sua área de atuação. Ou não têm interesse, ou não têm preparo para isso, ou a limitação intelectual os impede. Alguns acham que é "muito serviço" e "desnecessário". Tenho que o exercício da docência é um comprometimento com o conhecimento, não somente uma opção de vida/trabalho. Essa forma de ensinar equivocada leva o nome de estelionato acadêmico. E o curioso é que isso existe em todos os níveis, infelizmente.
ET – Ser filho do Antônio do Cartório te influenciou para cursar Direito?
Samuel – De uma certa forma eu acho que sim. O sonho dele era que eu fizesse Direito, na Uniube e prestasse concurso para a magistratura estadual em Minas Gerais. Para ele tinha de ser desse jeito: não podia ser outro curso, não podia ser em outra faculdade e não podia prestar outro concurso. Frustrei boa parte dos seus sonhos. Na época eu havia decidido que queria ingressar no Instituto Rio Branco. Queria ser diplomata, viajar pelo mundo. Fazia francês (que era o idioma oficial da diplomacia) e estava indo até bem. Mas o destino promoveu uma virada significativa na minha vida. Todos nós temos sonhos na vida que não puderam se realizar. Por outro lado, acredito que ainda hoje possam ser vividos. De uma forma diferente e com reservas, mas podemos vivê-los.
O curioso é que depois de formado eu vi uma prova do concurso do Rio Branco. É dificílima. Para mim é o concurso mais difícil que existe, pois engloba além do conhecimento jurídico, conhecimentos profundos de história, economia, relações internacionais etc. É realmente muito difícil. De todo modo, magistratura nunca foi um objetivo na minha vida. E nos últimos tempos o meu pai havia parado de insistir nisso. Acho que finalmente percebeu que não adiantava ficar falando.
A influência do meu pai foi marcante no modo como trabalho no cartório. Foi uma escola, e de vida. O curioso é que o meu relacionamento com ele melhorou muito depois que assumi o 2º Ofício e fui trilhar o meu caminho. Acho que passamos a nos respeitar mais. Ou talvez passamos a nos ver com outros olhos. Os últimos anos junto dele foram um período marcante e maravilhoso da minha vida.
ET – Como é que você chegou ao cargo de Tabelião de Notas, em um Cartório separado do do seu pai? Eu me lembro do cartório do Eurípedes Brigagão ali na casa da Da. Zizi, na praça Getúlio Vargas e seu pai era um dos tabeliães... Depois, ele se tornou o Tabelião e depois vieram os filhos...
Samuel - Assumi o Cartório do 2º Ofício, mediante concurso, em 2002. Desde então, sou o tabelião do Cartório do 2º Ofício de Notas. Lá, dirijo o cartório, lavrando escrituras, procurações, reconhecendo firmas, fazendo autenticações e testamentos. Comecei a trabalhar em cartório aos 12 anos, depois de uma experiência de uma semana na loja de calçados do saudoso Aresqui Silva. Fiquei no cartório de 1984 até 1990. Em 1990 ingressei na prefeitura, onde permaneci por 4 meses, saindo de lá para ser escrevente no Fórum. Neste, fiquei de 1990 até 1996. Em 1996 voltei para o cartório de meu pai, permanecendo até 2002, quando assumi o 2º Ofício.
Olha, as pessoas têm uma visão equivocada do que é e de como funciona um cartório. Vou tentar explicar brevemente. Cartório não é empresa familiar, não passa de pai para filho. O que ocorre é que na vacância do serviço, assume o substituto, este que geralmente é da família. Daí, criou-se a ideia errônea de que cartório é um patrimônio familiar, que passa de pai para filho, o que é uma inverdade.
Não se trata de ter um “cartório separado”. Quando você assume o serviço, que só se dá por meio de concurso público, você recebe a delegação do Estado e instala a serventia onde você achar que deve, respeitados alguns parâmetros legais.
Não existe “dono de cartório”. O “cartório” é o próprio Estado. Posso ser dono das mesas, dos computadores, do prédio onde ele funciona, mas nunca do “cartório”. Os livros, programas de computador indispensáveis ao funcionamento do serviço, fichas, arquivos e demais papéis são do Estado. Eu ajo como um depositário desses bens públicos, tecnicamente um delegatário. Quem assume o cartório leva somente isso, que é justamente o que integra o acervo da serventia.
Se o titular (vamos dizer assim, embora seja incorreto) morre ou fica impossibilitado de continuar na função, assume o seu substituto, ficando interinamente até o provimento por concurso público. Pode acontecer de o Estado demorar a realizar o concurso, ocasião em que o substituto permanecerá, mas interinamente. Talvez por isso (a demora do Estado em realizar o concurso) fique a ideia de que cartório é hereditário, o que, repetindo, é uma inverdade.
É certo que a administração do cartório é de nossa responsabilidade. Nós pagamos os funcionários, entabulamos os seus salários, provemos o necessário para o funcionamento da serventia, enfim, colocamos o serviço para produzir. Mas sempre com os olhos no serviço público, procurando dar um atendimento eficiente a todos os usuários, pautado nos princípios regentes da atividade notarial.
Você disse que o meu pai assumiu o cartório e depois vieram os filhos. O meu pai assumiu em 1967, por meio de concurso público, na época em que o juiz da comarca era o (hoje) Ministro do Superior Tribunal de Justiça (aposentado) Sálvio de Figueiredo Teixeira. Daí, ele permaneceu no cartório até o seu falecimento. Nós, os filhos, éramos empregados dele. Recebíamos salário. Só isso.
ET – Aí veio o casamento, filhos... Como tudo começou?
Samuel - Conheci a Leane na faculdade, onde começamos o namoro e estamos hoje com dois filhos maravilhosos, o João Gabriel e o José Miguel. Os nomes são influência do amigo e compadre José Alberto, pessoa maravilhosa a quem nós devemos muito de nossas vidas. As nossas vidas sem ele e a comadre Nira Dalva seriam ainda mais complicadas. São verdadeiros anjos que nos cercam.
ET – Você se define como Tabelião de Notas ou como Advogado? Em que mais você atua ou estuda?
Samuel – Não é questão de definição. Eu não sou advogado, pois advogado é quem advoga (exerce a advocacia), isto é, tem inscrição na OAB. Embora eu tenha habilitação e seja aprovado no Exame de Ordem, não sou inscrito, pois o cargo que exerço - de Tabelião de Notas - é incompatível com o exercício da advocacia). Tenho muito respeito pela advocacia. Aliás, carrego um arrependimento muito grande de não ter advogado enquanto pude. Vez por outra me dá uma vontade de mudar o rumo da minha vida e começar a advogar. Mas a idade já não permite tamanha aventura. Mas com toda certeza, se eu tivesse de escolher outra profissão que não a de notário, certamente optaria pela advocacia.
Sempre me perguntam se sou advogado? Tento explicar, mas sem sucesso. Aliás, tem pessoas que pensam erroneamente que se forma para advogado e vai sendo promovido até chegar a juiz. Não existe isso. Hoje, sou Tabelião de Notas e professor de Direito em cursos de graduação e pós-graduação. Faço doutorado em Direito na PUC-SP, sou mestre em Direito Privado, especialista em Direito Civil e Processual Civil e bacharel em Direito.
ET – Se você não pode advogar, por que continua se especializando dentro do Direito, foi o cargo de professor que o levou ao doutorado?
Samuel – Não tem nada a ver uma situação com a outra. A minha profissão de cartorário (eu prefiro notário) é jurídica. A atividade notarial (cartorária de notas) é jurídica. Eu não consigo entender a dificuldade das pessoas em compreender isso. Fico descontente quando vejo que algumas faculdades de Direito passam para os seus alunos a ideia falsa de que a vida jurídica é o trinômio juiz, delegado e advogado. É muito mais do isso, mas muito mesmo. Além de exercer uma função pública notadamente jurídica (tabelião de notas), sou também um jurista, no sentido estrito do termo. E o fato de ser um jurista é que me levou ao doutorado (que é destinado a formar pesquisadores, enquanto o mestrado é destinado a formar docentes), é uma consequência disso. A minha tese de doutoramento, inclusive, trata da atividade notarial no âmbito internacional. Não se trata de um luxo, um capricho de querer ser chamado de doutor. Aliás, há um costume na sociedade de chamar o médico, o dentista, o engenheiro, o enfermeiro, o juiz, o advogado, o promotor, o tabelião, o nutricionista, o psicólogo etc. tudo de “doutor”. É um costume chamar aqueles que concluíram um bacharelado de “doutor”, embora saibamos que nem todos são efetiva e tecnicamente doutores.
ET – Pode falar um pouco sobre a importância do Tabelião de Notas?
Samuel - Uma observação, talvez de cultura inútil: há uma discussão acadêmica sobre a titularidade do cargo público. Segundo alguns, o titular do cargo é o povo. Mas muita gente fala em titularidade: dizem que o tabelião é o titular do cartório; que o juiz é titular da vara tal; o promotor é titular da promotoria tal e assim por diante. Cientes do dissenso, vamos ao item. O Tabelião de Notas exerce a função de garantidor da publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos negócios jurídicos.
ET – Um dos motivos de seu constante aperfeiçoamento, estar sempre atualizado...
Samuel - O dia-a-dia cartorário (a atividade em si) mudou muito e estar acompanhando isso é fundamental para o desenvolvimento da serventia. Estar sabendo o que acontece aqui e lá fora é importante também para o usuário, que sempre busca a segurança jurídica.
ET – Embora, para muitos o Tabelião de Notas continua ainda sendo 'um lugar de passar escrituras'...
Samuel – É verdade. Muita gente vê o cartório somente como o local onde se reconhecem firmas, fazem autenticações de cópias e escrituras de compra e venda de imóveis. Porém, a atuação notarial vai muito além disso. A doutrina moderna nos coloca como uma espécie de juízo que atua preventivamente, ao contrário do Poder Judiciário que conhecemos. Explicando melhor, o tabelião atua preventivamente, procurando amoldar o negócio jurídico de forma que não venha a provocar dissenso entre as partes; já o Poder Judiciário atua somente no caso de dissenso propriamente dito, isto é, quando as partes não conseguiram chegar a um acordo, tendo de provocar o Estado para resolver a sua situação.
Só que infelizmente nós somos conhecidos como os 'fazedores de escrituras', nada mais.
ET – O Prof. Samuel está se tornando também conhecido no meio acadêmico por conta de suas publicações. Quais são essas obras?
Samuel - Eu tenho hoje publicadas três obras, sendo uma de autoria única (fruto da minha dissertação de mestrado) e outras duas em co-autoria com os demais membros do Grupo de Estudos Agrários da USP (GEA-USP) e da Unesp-Franca. Há uma outra, também em co-autoria, que está em fase final de formatação para entrar no prelo, em que escrevi um capítulo sobre a aquisição de terras por estrangeiros, tema que proferi palestra no I Congresso de Direito Agrário, promovido pela Faculdade de Direito da USP (Largo São Francisco) e OAB, seção São Paulo, e dei entrevista para a rede de TV Canal Rural. E alguns artigos publicados.
ET – Dois artigos merecem destaque e que gostaríamos que falasse sobre eles. Um publicado na Itália um outro na revista da Unesp. É isso?
Samuel – Sim, o primeiro foi publicado em 2004 no periódico eletrônico italiano, Diritto & diritti (traduzindo, Direito e direitos). Trata-se de um artigo sobre a responsabilidade civil dos administradores de instituições financeiras. Vários brasileiros publicam nesse periódico, que é respeitado no meio jurídico, mas não é nada demais. Curiosamente, o artigo que mais me orgulha é um que escrevi despretensiosamente em 2001, na revista eletrônica da Unesp, tratando da cumulação do dano estético. Na época escrevi tão somente para robustecer o meu currículo e não é que ele foi citado recentemente em dois julgados, um do Tribunal de Justiça de Santa Catarina e outro do Tribunal Regional do Trabalho de Sergipe! No meio jurídico é o que chamamos de "virou doutrina", significando que estou trilhando o caminho correto. Tem também alguns que republiquei na Internet e que tiveram uma repercussão muito expressiva.
ET – Vamos falar agora do Prof. Samuel. Temos aqui uma lista de instituições onde foi e é professor. Quando começou a lecionar?
Samuel - Comecei a lecionar na graduação em Direito em 2006, na Unipac de Uberaba. Lá fiquei até 2008. Fiz grandes amizades e guardo com muito carinho aquele tempo. Só que viajar todas as semanas para Uberaba ficou cansativo. Lá entrei pelas mãos da brilhante professora Maria Heliodora do Vale Romeiro Collaço, uma figura extremamente responsável, dedicada, sensível e inteligente, que hoje é a diretora-geral da Facthus, em Uberaba. Sinto-me orgulhoso de tê-la como amiga, que é um exemplo a ser seguido por muitos. Na Unipac lecionei Direito Civil: obrigações; Direito Civil: contratos; e Direito Civil: coisas. Em 2006 comecei a dar aulas na pós-graduação em Franca (Unifran), no curso de especialização presencial em Direito Civil e fiquei até a última turma (acho que em 2007).
ET – Foi quando começou no Instituto de Londrina?
Samuel – Sim, em 2007 fui convidado para dar aulas na pós-graduação do Instituto Brasileiro de Estudos (Ibest), uma instituição de Londrina-PR, referência nacional em cursos de especialização em Direito Notarial e Registral. Pelo Ibest ministrei aulas de norte a sul, leste a oeste do Brasil, sempre tratando de Direito Notarial (que é, por assim dizer, o direito da atividade cartorária) para os colegas de profissão. Em 2009, depois de três finais de semana seguidos viajando, sendo o último em Manaus (que fiquei cinco dias fora de casa), resolvi me dar um pouco de descanso. Agora estou retornando, mas com menos frequência.
ET – Uma experiência na PUC de Belo Horizonte...
Samuel - Em 2008 e 2009 participei, como professor orientador, do curso de especialização em Direito Registral Imobiliário da Puc Minas. Lá tive alunos brilhantes, que são hoje grandes nomes da atividade notarial e registral.
ET – Chegou a prestar concurso para alguma instituição de ensino superior pública?
Samuel – Sim, em 2009 ingressei, mediante aprovação em primeiro lugar em concurso público, como professor substituto de Direito Civil na graduação em Direito da Unesp, campus de Franca, permanecendo até o final de 2010, ocasião em que se extinguiu o contrato de trabalho (que era temporário). Ministrei Direito de Família e Sucessões. Foi um período gratificante. O alunado da Unesp é diferenciado, o que reflete na excelência dos seus cursos, sem pretender desmerecer a filosofia de trabalho da instituição, que é muito interessante. Agora estou retornando à casa, também por concurso público, lecionando Direito Internacional para os alunos da graduação em Direito e em Relações Internacionais.
ET – Outros trabalhos no magistério?
Samuel - Desde 2008 ministro um curso de extensão na Faculdade de Direito de Franca (onde fiz o bacharelado), tratando de Direito Notarial, a convite do Prof. Dr. Celso Berardo, outro grande e admirável amigo. Também, a partir desse ano, lecionei na pós-graduação da Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes a disciplina "ata notarial", na modalidade telepresencial e "ao vivo", para mais de 800 alunos de todo o Brasil. Hoje, além do retorno à graduação da Unesp, ministro somente algumas aulas em pós, dedicando-me mais ao doutoramento.
ET – Em que área você está fazendo o doutorado?
Samuel - O meu doutoramento é em Direito Internacional. Comecei em 2008 na Puc Minas o doutoramento em Direito Privado, mas desisti em razão do meu ingresso no GEA-USP (Grupo de Estudos Agrários da Usp), mediante aceitação do Prof. Dr. Fernando Campos Scaff, professor titular de Direito Agrário da USP em São Paulo, pessoa que me acolheu muito bem lá, que a tenho com enorme admiração e que me honra com a amizade. Ano passado resolvi fazer o doutoramento na PUC-SP, tratando da atividade notarial no Mercosul, razão pela qual ingressei no núcleo de Direito Internacional depois de me submeter aos exames de ingresso. Lá na PUC-SP tive a oportunidade de ser aluno de Maria Helena Diniz, na disciplina de Filosofia e Teoria Geral do Direito. Só essa disciplina valeu mais que os dez anos de estudos de teoria geral e filosofia que fiz. O núcleo de filosofia jurídica/teoria geral da PUC-SP, capitaneado por Tércio Sampaio Ferraz Júnior, Maria Helena Diniz e Paulo de Barros Carvalho, dentre outros notáveis, é hoje uma referência no mundo jurídico.
ET – E como vão as palestras? Sabemos que o Prof. Samuel tem percorrido o país proferindo palestras a convite de várias instituições.
Samuel – Não é bem assim. Viajo muito para dar aulas. Tenho proferido algumas palestras na Faculdade de Direito da USP, do Largo São Francisco e de Ribeirão Preto, somente por obra da minha participação no GEA-USP. Esse é um fato que tenho plena consciência. O GEA é que oportuniza isso, não se tratando de mérito meu. Mas curiosamente a primeira palestra foi proferida aqui em Sacramento, em evento da OAB, a convite do então presidente, Dr. Juarez Ribeiro Venites, que me deu a honra de falar ao lado do ilustre professor da UFMG e procurador do Incra (e também de Sacramento), Dr. Ivan Barbosa, pessoa que tenho igualmente com muita admiração e simpatia. Não me esqueço dela. Ele, Dr. Juarez, ao me convidar, quebrou o paradigma de que "santo de casa não faz milagre". Não sei se fiz o "milagre", mas dei a palestra.
ET – Sua palestra em Sacramento sobre georreferenciamento foi muito elogiada junto aos produtores rurais. Qual a sua importância para o país e até quando os fazendeiros devem atualizar a medição de suas propriedades?
Samuel - Essa foi agora, recente. O querido Hermógenes Ribeiro, presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Sacramento, também quebra o paradigma, convidando-me para falar sobre o georreferenciamento de imóveis rurais para os produtores daqui. Fiquei honrado com o convite e muito satisfeito com o resultado. O georreferenciamento (geo) é uma técnica moderna de medição, que o Incra adotou para a medição dos imóveis rurais. A lei que o previu é de 2001, foi regulamentada em 2003 e os prazos para a realização do geo começaram neste ano (2003). Paulatinamente, foi atingindo todas as propriedades, começando pelas maiores e atingindo agora todas elas, indistintamente. Em novembro deste ano, vence o prazo final e toda propriedade deverá ser georreferenciada nas hipóteses previstas no regulamento. Isso se o prazo não for novamente estendido. Escrevi um parágrafo sobre o tema em livro de autoria coletiva, junto com o pessoal do GEA-USP.
ET – Torna-se, então, a partir de novembro, uma obrigação até mesmo para a venda das terras?
Samuel – Sim, por consequência, se você é proprietário e quiser vender a sua propriedade, terá de georreferenciá-la. E aí começam os problemas: custo do procedimento, demora para a certificação do trabalho pelo Incra e abertura de nova matrícula. Tive um caso no cartório que para isso levou mais de dois anos. Ou seja, poderiam os proprietários ter perdido a venda. Em suma, esfriará o negócio imobiliário envolvendo terras. Eu entendo que isso é realmente preocupante.
ET – Agradecemos a entrevista e parabéns pelo seu trabalho.
Samuel - Obrigado!