Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

Crônica - Lembranças de vidas...

Edição n° 1275 - 16 Setembro 2011

Parece que a gente sonha e não acorda mais em alguns momentos da vida... mas quando vê, não é um sonho, é uma realidade que chega a doer na pele. Quando o duro golpe da morte do Ricardo ainda era sentido, tombou mais um, para por à prova a fé que temos em nossos corações. Em menos de noventa dias, a morte visitou sem piedade uma casa que foi alicerçada sobre a espiritualidade, com ensinamentos Kardecistas e católicos. Visitou e arrancou de maneira abrupta e inversa a lei natural da vida, dois filhos queridos de meus tios, Jorge e Amália. Primeiro levou Ricardo, vitimado por um atropelamento que deixou sua esposa Rita e seus filhos desacobertados da proteção amorosa deste médico de homens e de almas. Como rocha, mas com o coração sangrando, lá estava o casal, Jorge e Amália, devolvendo a Deus o que Lhe pertencia. Também Biá e Jorge Luiz carregaram a dor de sepultar o irmão no Jazigo da família Cordeiro. Jorge Luiz combalido pelo câncer que o assolava há anos, mas sempre esperançoso em continuar no meio de nós, expressou várias vezes naquele triste dia: “e agora, quem vai cuidar de mim?”. Sentiu que a ausência do irmão seria a falta de algo que lhe mantinha vivo. E assim, naquela segunda-feira, 12 de setembro, o nosso “Jojoca”, entregou-se a Deus, indo ao encontro do irmão. Ali, na São Pedro, 29, a cicatriz se abriu novamente, e Jorge e Amália, que acabaram de completar 60 anos de casados, se viram órfãos de seus próprios filhos. Jorge Luiz lutou como pode. Lutou firme. Lutou com garra. Mas foi vencido, ou achamos que foi pelo “mal do século”, ainda sem cura, e que tem levado de nosso convívio diariamente tantos e tantas. As 15h quando o sepultamento saía, eu daqui de BH, me unia àqueles que carregavam as alças da saudade em direção à morada eterna, e aí me lembrei de uma cena em que o nosso Jorge Luiz era ator principal. Eu era moleque e sentávamos diariamente no “alpendre da D. Ada.”, para compartilharmos do café após o almoço. Andando de lá pra cá, o meu avô João com seu jalecão branco e as mãos para trás, ouvia atento as conversas, sem muito opinar. Estavam lá o Marcelo, a Tia Angélica, o Flávio, o Mauro, minha mãe e minha avó, sentados cada qual em suas cadeiras privativas, esperando a “Madame” chegar, esguia e elegante como só ela, protegida por sua inseparável sombrinha. Meu pai ia até a ponta da escada esperar pela Tia Amália, beijando-lhe as mãos, pedindo sua bênção e a inclusão de seu nome num famoso caderninho de anotações que ela ainda o tem. A vó Lú trazia a bandeja com o café, para depois anotar os números da mega sena e dizer que a novela “tá boa” quando meu pai perguntava do episódio do dia anterior. A conversa estava sempre animada quando apontava no alpendre o Jorge Luiz com sua preciosa “bike”, antes de ir dar suas aulas de educação física. Ao subir as escadas, as brincadeiras se voltavam contra ele, para as gargalhadas do Mauro. E assim o tempo se foi...  às 3 da tarde eu me dei conta de novo de que não tinha mais o meu avô, não tinha mais minha avó, não tinha mais a D. Lourdes, não tinha mais o famoso alpendre e agora também não tinha mais o Jorge Luiz... Onde estão todos? Por que se foram? Eles não se foram.... estão sendo lembrados e homenageados neste artigo e restarão vivos enquanto vida tivermos.

 

Bruno Scalon Cordeiro