Largo da Matriz. Praça da Matriz. Coração da cidade. Marco indelével da vida sacramentana. Território sagrado onde brotou a vida social desse lugar. Descampado de terras devolutas nos inícios do século XIX.
Descampado de 1812 que viu chegar os homens da Bandeira, bravos homens do sertão à cata de ouro e de almas. Descampado de 1812 que viu Hermógenes, um jovem padre bandeirante, em meados daquele ano, ajudado por alguns garimpeiros do Ribeirão Borá levantar uma Cruz neste exato lugar e aqui rezar a primeira missa de nossa história. Fato auspicioso que no próximo ano, completa 200 anos.
Largo da Matriz que abrigou as primeiras habitações e foi o primeiro cemitério da vila. Largo da Matriz cruzado diariamente por boiadas que perambulavam pelo sertão. Largo da Matriz onde famílias se arranchavam sob carros-de-boi durante os novenários das festas religiosas. Largo da Matriz que viu nascer inúmeras famílias sacramentanas, abrigando dentro de si os primeiros flertes, os namoricos de época. Largo da Matriz dos primeiros colégios públicos: o Colégio Santa Cruz em 1883, o Liceu Sacramentano em 1901, o Colégio SS. Sacramento em 1908 e o Colégio São Luiz em 1919.
Largo da Matriz das festas de agosto cheia de bandas e de prendas, dos festejos do Divino Espírito Santo em cujo dia da festa o povo aqui se ajuntava para ver para qual lado a bandeira do Divino pendia no alto do mastro, indicando assim a casa do festeiro do próximo ano. Largo da Matriz dos sons festivos dos sinos nas madrugadas de festas e dos sons lânguidos dos cortejos fúnebres que a cruzavam silenciosos, regados a lágrimas e dor. Largo da Matriz que ostentou em 1908 o magnífico relógio importado da Alemanha, hoje silencioso e esquecido no alto da torre.
Largo da Matriz que se tornou ,em 22 de maio de 1926, o “Jardim Municipal Cel Franklin Vieira”, data em que aquele Agente Executivo implantou pela primeira vez a urbanização do espaço público da praça. Data também em que se plantaram as palmeiras imperiais que ainda dão o toque altivo dessa praça. São as únicas preciosidades que ainda se mantêm do primeiro jardim.
Jardim Municipal que abrigou tropas militares nas revoluções de 1930 e 1932 e que, em 1945, assistiu festiva o regresso dos filhos deste lugar que combateram na II Guerra Mundial. Jardim Municipal que por um Decreto de 1938, se tornou Praça Getúlio Vargas, mas que nunca deixou de ser a Praça da Matriz.
Praça Getúlio Vargas dos calorosos palanques políticos, dos sons de bandas famosas, do coreto antigo, do leilão festivo, das piedosas procissões, dos alto-falantes dos cinemas.
Praça Getúlio Vargas do senadinho do Sussu onde, talvez mais que na Camara Municipal, a vida política era debatida e comentada. Praça Getúlio Vargas de famílias tradicionais, de peso extraordinário na história desse lugar: Brigagão, Benedito, Araujo, Cunha, Afonso, Martins, Souza, Ribeiro de Oliveira e Maluf. Famílias outras que, na parte alta da praça, fora do perímetro do jardim, marcaram época: Soares, Giani, Zago e Cordeiro.
Praça Getúlio Vargas da primeira agência do Banco do Brasil, do Bar Hollywood, da loja de presentes da Olga Tormin, da farmácia do Labieno, do banco do Pedrinho Giani, do bar Estrela, onde a população se aglomerou um dia em plena rua, nos princípios dos anos 60, para ver admirada o primeiro aparelho de televisão. Praça da antiga e tradicional Casas Pernambucanas, praça cheia de histórias e de vidas que comportaria a escritura de um livro e não as poucas e tolhidas palavras que esse historiador levanta agora.
Praça reformulada e reestruturada no final da década de 1960 por um dos grandes e valorosos homens deste lugar: Prefeito José Sebastião de Almeida. Praça cuidada por todos os demais administradores municipais e que hoje, na administração de Dr. Wesley De Santi de Melo recebe, novamente, reestruturação, adaptação às exigências da época, iluminação adequada e é entregue ao povo – o povo - verdadeiro dono do lugar, verdadeiro legatário do descampado de 1812 que Hermógenes abençoou ao rezar aqui a primeira missa e invocar aqui o Santo Nome de Deus.
Que nosso povo seja feliz sempre pelo alto valor desse ato. É o nosso desejo.
Amir Salomão é advogado, historiador e escritor