Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

Crônica - Desapego

Edição n° 1196 - 12 Março 2010

 

 Mariú Cerchi Borges

 

Entrando na contra mão dos apelos comerciais que nos convidam, insistentemente, a consumir para além de nossas necessidades, a Campanha da Fraternidade Ecumênica deste ano, aponta para uma direção contrária: “Economia e Vida – Vocês não podem servir a Deus e ao Dinheiro”. Mas, surgem algumas dificuldades: Como resistir ao consumo se tudo que desejamos está ao nosso alcance?  Se, ao adquirir tais coisas, nos tornamos mais felizes e cheios de poderes? Se, a cada nova aquisição tal objeto passa a ser uma extensão do nosso eu?  Como resistir se temos prestações (sem juros), a perder de vista?  A ajuda do governo com isenção do IPI?  Frete grátis? Desta forma, frente a tanta facilidade, vamos comprando, comprando, sem critérios, sem planejamento, de forma desorganizada, indisciplinada, irresponsável. Acumulamos coisas supérfluas acreditando-as necessárias, e o que é pior, apegando-nos elas. O apelo comercial tem tal força a ponto de nos convencer de que aquele produto que adquirimos era realmente, indispensável para o nosso bem estar.  E assim, sentindo-nos livres para consumir, nos tornamos escravos do consumo.  Criamos imaginariamente coisas que nos faltam, e essa “suposta” falta começa a nos roubar a tranqüilidade e a liberdade.  Frente a esse consumo desenfreado precisamos, com urgência, abrir o nosso entendimento para distinguir o que nos é verdadeiramente essencial para podermos deixar de lado, o supérfluo, ou seja, educar nossos hábitos de consumo rumo a uma pedagogia do desapego que nos capacita a viver melhor com menos, ou seja, com mais desprendimento.   

A esse respeito, transcrevo, um  pequeno trecho, retirado de um email recebido,  e que a nosso ver, ilustra muito bem a transitoriedade  da vida: ”Tudo o que tens hoje pertencia a outra pessoa ontem, e pertencerá a outra no dia de amanhã. Erradamente desfrutaste da idéia de que isso te pertencia”. Nessa mesma linha de raciocínio, o Mestre recomenda: ”Não ajunteis para vós tesouros na terra, onde a ferrugem e as traças corroem, onde os ladrões furam e roubam. Ajuntai para vós tesouros no céu onde não os consomem nem as traças nem a ferrugem, e os ladrões não furam nem roubam” Mt 6, 19-21. Também, em Lc, 3-11, o Mestre ensina:” Quem tem duas túnicas dê uma a quem não tem; e quem tem o que comer, faça o mesmo”.

O fato, talvez, de nos sujeitarmos cegamente aos comandos da mídia, costuma gerar desejos e necessidades cada vez mais insaciáveis, pois, a cada concessão que fazemos, outras vão surgindo aprisionando-nos num querer sem fim. Sabemos de pessoas que se tornam extremamente infelizes por ficarem contabilizando o que lhes falta ao invés de render graças pelo que já possuem. Quem sabe seria esse  um bom momento para afugentar do nosso intimo o medo das perdas  para  empreendermos, com coragem, o difícil aprendizado em direção ao desapego?