Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

Política externa, democracia e a polarização política no brasil

Edição nº 1525 - 8 de Julho de 2016

Em um país com mais de 200 milhões de habitantes, a polarização política é um instrumento fundamental de um estado democrático para organizar o debate político para o eleitor. Contudo, a falta de democratização dos meios de comunicação associada aos interesses das grandes corporações e a sua tendência político-partidária, vem empobrecendo a qualidade dos debates políticos na sociedade ao distorcer a noção de interesse nacional em favor de minorias ruidosas e conservadoras. Embora não seja admitido pelos meios conservadores de comunicação, a agenda progressista da Política Externa Brasileira conduzida durante os governos de Lula da Silva e Dilma Rousseff, denominados pós-neoliberais, destacou-se historicamente pelo intenso protagonismo internacional, acompanhado de ganhos nas dimensões sociais, políticas e econômicas nos âmbitos nacional e internacional.
Os governos pós-neoliberais recuperaram a autonomia decisória da política externa brasileira, no melhor sentido “Ativa e Altiva”, segundo denomina o ex-Chanceler e Embaixador Celso Amorim. As políticas de combate à fome e à pobreza tornaram-se referência internacional, o princípio da “não-indiferença” buscou minimizar as desigualdades substanciais entre os países e a ênfase atribuída a integração regional na América do Sul não se tratava simplesmente de uma diretriz de governo, mas uma prática de Estado, consagrada na Constituição e que confere maior latitude às ações políticas e econômicas do Brasil.
Com relação ao desenvolvimento econômico, o Estado brasileiro atuou para diminuir a dependência tecnológica e financeira do país e ampliou as políticas sociais, com o intuito de reduzir as disparidades socioeconômicas regionais. A visão universalista dos governos de Lula e Dilma representou o modelo neodesenvolvimentista brasileiro e está associada à última experimentação política à esquerda vivenciada no Brasil durante os governos de Jânio Quadros e João Goulart, antes do golpe militar. 
Ao assumir o Ministério das Relações Exteriores, interinamente, José Serra, que não é diplomata de carreira, mas um conhecido político do círculo conservador da burguesia brasileira, cujo projeto político neoliberal foi rejeitado nas últimas eleições, critica em seus discursos o componente de ideologização e/ou partidarização da política externa exercida pelo Partido dos Trabalhadores e a aproximação com o eixo bolivariano na América do Sul, da qual o Brasil mantém uma relação importante em termos comerciais, políticos e de segurança internacional.
No entanto, a diretriz internacional que o governo interino imprime no Itamaraty não apresenta legitimidade democrática ou elementos necessários à proteção do interesse nacional, pois esta política além de não representar a sociedade, (re)posiciona o país em uma relação de dependência com os países desenvolvidos, incita a polarização política baseada no conflito de classes e instrumentaliza uma das instituições brasileiras mais respeitadas ao redor do mundo como plataforma política, em detrimento de uma política externa nacionalista, com vistas à promoção do desenvolvimento socioeconômico do país.
A política de abertura do Pré-Sal para as multinacionais estrangeiras, a proposta de “flexibilização” no Mercosul, o esfriamento político com o agrupamento dos BRICS e o afastamento das políticas de cooperação Sul-Sul sinalizam algumas das proposições que dificultam a busca pela autonomia do país no plano internacional e afetam as perspectivas internas de investimento nas áreas de saúde, educação e infraestrutura. Seu processo decisório afasta-se das esferas públicas de discussão democrática sobre o rumo internacional do país e leva o Itamaraty, novamente, ao seu tradicional insulamento, em prejuízo dos esforços de democratização e desenvolvimento do país realizados nos 13 anos de governos pós-neoliberais no Brasil.

 

(*) André Siqueira é Pós-Graduando em Relações Internacionais com área de concentração em Política Internacional pelo Instituto de Economia da UFU