Sacramento teve a oportunidade rara de assistir ao espetáculo teatral, Memórias de Bitita – O coração que não silenciou, apresentado na Casa da Cultura, nessa quarta-feira 19, pelo Grupo Circo de Teatro Olha da Rua, de Belo Horizonte. O espetáculo, idealizado e dirigido por Carlandreia Ribeiro, em comemoração ao centenário de vida da escritora sacramentana, Carolina Maria de Jesus, em 14 de fevereiro de 2014, foi agraciado com o Prêmio Artes Cênicas de Minas Gerais, pela Secretaria de Estado de Cultura de Minas Gerais, que promove também sua divulgação pelo interior do Estado.
Memórias de Bitita – o coração que não silenciou trata da vida e obra da escritora Carolina Maria de Jesus, escritora, autora do best seler, Quarto de Despejo. O texto promove muitos desdobramentos pedagógicos para além da ideia de letramento. “A literatura de Carolina pode ser transversalisada em diversos aspectos, desde a escrita propriamente dita, tanto no sentido histórico no que tange à história do Brasil, nos anos pós-abolição, até as questões que envolvem o âmbito de gênero - da mulher e sociedade”, justificou a autora do texto.
Com razão, a diretora da Superintendência Regional de Ensino - SRE, Profa. Marilda Ribeiro Resende, fez um apelo às escolas da rede estadual no sentido de que os diretores incentivassem os alunos para assistirem ao espetáculo e participassem da oficina, A escrita da memória - Diários de Vivências seguindo os passos de Carolina Maria de Jesus, que o grupo também apresenta nas cidades visitadas. Dado o caráter formativo da peça, três cidades da circunscrição da SRE foram escolhidas para a apresentação do grupo, Araxá, Uberaba e Sacramento, sua terra natal.
“- Promover, por meio do espetáculo, a efetiva aplicabilidade da Lei 10.639/2003 que torna obrigatório o Ensino de História e Cultura Africana e Afro-brasileira nas escolas de educação básica, bem como o Parecer do CNE/CP 03/2004, que aprovou as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Étnico-Raciais”, foi um dos objetivos do projeto, justificou a Profa. Marilda Ribeiro.
O espetáculo cênico/musical é uma livre adaptação da obra de Carolina Maria de Jesus (1914-1977) e apresenta a força, a determinação, a generosidade e o lirismo contidos nos diários e composições musicais da autora. Negra, favelada e semianalfabeta, o texto revela uma mulher sensível, plenamente consciente de seu lugar e o papel que deveria ocupar: ser cronista de uma realidade onde nossa principal característica – ser humano - é sistematicamente ultrajada e a cidadania negada. O espetáculo tem como objetivo dar voz a uma mulher extraordinária que a despeito de seu enorme talento morreu como sempre viveu: pobre!
Para a construção da dramaturgia foram costurados fragmentos dos seus diários - as vivências, reflexões e acontecimentos, que podem ser transportados claramente para os dias atuais. Carolina escreveu, por exemplo, em 20 de maio de 1958 (...) “quando um político diz nos seus discursos que está ao lado do povo, que visa incluir-se na política para melhorar as nossas condições de vida pedindo o nosso voto e prometendo congelar os preços, já está ciente que abordando este grave problema ele vence nas urnas. Depois divorcia-se do povo. Olha o povo com os olhos semi-cerrados. Com um orgulho que fere a nossa sensibilidade”.
“- A peça é um convite às Carolinas que somos para que também não se calem e não se submetam à miséria e à opressão. Seremos todas Carolinas em seus quartos de despejo, a despejar emoções e laivos de alegria e de música. Seremos atores e espectadores de um diário que ainda teima em continuar a ser escrito, pois que de uma Carolina, se desdobram muitas e multifacetadas Carolinas. Ela tem fases como a lua que míngua, se enche e se renova a cada vez que a roda do mundo gira. E como a lua, a vida inconstante das Carolinas que somos, morre e renasce da brutal e fascinante tarefa de sobreviver”, argumenta também com razão a diretora Carlandreia Ribeiro.