Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

Os embargos que não me infringem

Edição nº 1382 - 04 Setembro 2013

Ainda paira em boa parte da tradicional família brasileira, uma certa comoção (especialmente, por conta da grande mídia, leia-se, O Globo, Estadão, Folha, Veja...) o voto do ministro Celso de Mello, aprovando os embargos infringentes, na ação penal 470, o chamado Mensalão do PT. 

Só prá entender: A Procuradoria Geral da República sustenta que o mensalão foi um esquema ilegal de financiamento político organizado pela cúpula do PT para garantir apoio ao governo, comprando votos no Congresso Nacional em 2003 e 2004, no primeiro mandato do presidente Lula. Segundo a acusação, os recursos públicos foram desviados pelas agências de publicidade do empresário Marcos Valério, em meio a supostos empréstimos dos bancos Rural e BMG. O esquema teria distribuído ao menos R$ 43 milhões ao PT e a mais quatro partidos aliados.

Senti isso quando minha filha, acadêmica de direito, criticou o voto do eminente ministro, segundo ela, na esteira de alguns outros mestres da universidade... Não acreditei. Não temos mesmo mais voz ativa nem sobre nossos filhos. “Não, até tu, Brutus?!!” – disse-lhe, me surpreendendo com sua posição.

E não é que lavrando o artigo, recebo a visita de velha amiga dos tempos dos bancos escolares. Sábia e culta, meus ouvidos são sempre atentos ao seu discurso, que passa pelos últimos livros, filmes e chega ao Mensalão, numa severa crítica ao ministro Lewandowsky, um dos cinco do STF que votou pelos embargos. Indo mais longe, minha amiga mostrou até a culpa dos já condenados réus.

Como me presenteou com um livro de um dos meus autores preferidos, Rubem Alves, calei-me na réplica e me questionei, se valeria a pena elogiar o voto de Celso de Mello, que provocou a ira dos avatares da avenida Paulista e da grande imprensa que desde o princípio vem tentando pautar o julgamento. 

Vale, sim! Vale defender o direito de defesa das garantias individuais. Nas palavras do douto ministro, o mais longevo daquela corte: “Não se trata de discutir meras tecnicalidades jurídicas. Este é um tribunal de princípios, que respeita os princípios que a constituição consagrou em seu texto. O STF está prestando reverência ao seu compromisso constitucional de respeitar direitos, garantias e liberdades fundamentais não importando quem os invoque”.

E falou muito mais. Celso de Melo comprovou com argumentos que duraram 2h30m a validade dos embargos infringentes na justiça brasileira (apesar de não terem sido mencionados na lei 8.038). Embargos que poderiam ter sido extintos em 98, quando FHC enviou projeto ao Congresso Nacional para acabar com eles. Sabem quem votou contra? Todos os partidos, inclusive a bancada de oposição, representada pelo PSDB, DEM, PPS..., que hoje vociferam contra o ministro.

Em recente artigo, falei neste espaço sobre o poder da imprensa. O voto do ministro foi lido em plenário no dia 18 de setembro, desde o dia 13, os grandes jornais pressionavam: Editorial no Globo e no Estadão; artigo no Estadão, 'O juiz e a sociedade'; 16, editorial na Folha; na véspera, todos se manifestarem pela rejeição dos embargos: 'O STF não pode perder o juízo' (O Globo); 'De Marcha à ré' (Folha); 'A última chance' (Estadão) e do cronista, Arnaldo Jabor, o título pretencioso, 'Amanhã, o Brasil muda'. Para sua decepção, não mudou! Até o Estado de Minas se arvorou numa carta ao ministro Celso de Melo, 'De Minas para Brasília', pretensiosamente assinada pelos 'cidadãos do Estado de MG', acenando pela impunidade. Sou mineiro, mas não assinei a missiva do diário mineiro.  

A essas pressões, respondeu o ministro Celso de Mello: “O direito de defesa é prerrogativa de que ninguém pode ser privado, ainda que se revele antagônico ao sentimento das ruas. Assim, sempre será, enquanto o STF puder julgar imune, às pressões externas, qualquer uma”.

Não pensem, por favor, que minha tese é de defesa intransigente dos réus da ação penal 470. O que defendo é o seu direito de defesa. Primeiro, porque não há provas. Não é preciso ser um profissional do direito, para se surpreender e suspeitar por que a ação chegou a esse ponto. Não há provas reais apresentadas pelo Procurador, de compra de parlamentares e uso de dinheiro público por ação da cúpula do PT, à época, José Dirceu. 

Pergunta-se, se for absolvido do crime de formação de quadrilha, como fica? Esbarra-se na tese do 'domínio do fato', a mesma que condenou Dirceu. Se não houve quadrilha, não houve chefe; e se não houve um chefe não houve um fato comandado por alguém. Logo, por que condenar? É a maiêutica do velho Sócrates.

Mas aguardem, porque vem aí o Mensalão do PSDB, o Mensalão do DEM... O Mensalão do Príncipe da Privataria para sua reeleição; o Mensalão da Rede Globo, que deve R$ 615 milhões (cálculo de 2006) por sonegação, à Receita Federal. Até o Mensalão dos vereadores de nossa Câmara Municipal, se não comprovarem o gastos de suas viagens... Ops!! (WJS)