O jornal O Estado do Triângulo nasceu nos revolucionários anos 60, os Anos Rebeldes que transformaram cultura, arte, música, cinema, política, guerras, ciências, tecnologia, história, pessoas. Um tempo de coisas muito boas e outras muito ruins, mas que tiveram cada uma o seu maior ou menor mérito.
Nesse tempo, The Beatles, os meninos de Liverpool, John Lennon, Paul McCartney, George Harisson e Ringo Starr, eram os arautos musicais no mundo, através das ondas sonoras do velho rádio, vitrolas ou nas TVs que já haviam chegado às capitais. O Rock and Roll, - que no Brasil ganhou o nome de iê-iê-iê, uma livre tradução do refrão da música She loves you, dos Beatles: "She Loves You, Yeah, Yeah, Yeah!" -, ganhou crescente popularidade no mundo, associando-se ao final da década à rebeldia política e não parou mais até nossos dias. Janis Joplin, símbolo do movimento de contra-cultura na música com o rock psicodélico dos hippies; Jimi Hendrix, Joan Baez, já substituindo o reio do Rock, Elvis Presley, iniciando seu declínio, além do romantismo de Sinatra.
Pelo rádio, o Brasil vibrou com o título de bi-campeão na Copa do Mundo no Chile. E nascia a brasilidade com os talentos de Milton Nascimento, Tavinho Moura, Wagner Tiso e tantos outros, com o Clube da Esquina, nas Gerais. Roberto Carlos, Erasmo e Wanderlea com a Jovem Guarda no eixo Rio/Sampa. Vinícius, Chico, Gil, Caetano Veloso, Edu Lobo, Elis, Tom Jobim, Toquinho dando o tom à MPB... Os festivais de Monterey e Woodstock de lá do Atlântico, de cá a MPB dava vida a novos valores musicais nos festivais da Record.
Jean-Luc Godard trazia o vanguardismo no cinema internacional e Glauber Rocha inaugurou o cinema novo; Brigite Bardot reinava absoluta como o maior símbolo sexual da década. Sofia Loren, Giana Lollobrigida, os padrões de beleza... João XXIII deixava para a Igreja o seu maior legado, o Concílio Vaticano II, enquanto era erguido o Muro de Berlim. Che Guevara consagrou-se como símbolo de luta em defesa do oprimido; Jânio Quadros renunciou; John Kennedy, assassinado.... E muito mais marcou a década.
1968 é também conhecido como o “ano mágico da história”. Foi nesse ano que nasceu o ET. Ano em que Dr. Zerbini fez o primeiro transplante de coração no Brasil - o pioneirismo ficou com Christian Barnard, na África do Sul, em 1967. Nesse mesmo ano, o ativista pelos direitos civis, Dr. Martin Luther King, foi assassinado, mas deixou plantada a semente cantada em I have a dream. A baiana Marta Rocha foi eleita a mais bela do mundo. Morria Ian Fleming, criador do grande astro 007, James Bond, que atravessa gerações...
Nesse ano, os líderes do movimento estudantil no Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE) foram presos (15/10); a casa de Dom Helder Câmara foi metralhada em Recife e, começava a guerra do Vietnan... Nesse ano a canção, "Pra não dizer que não falei das flores" interpretada por Geraldo Vandré, ficou em segundo lugar no Festival Internacional da Canção.
Sabiá, de Tom Jobim e Chico Buarque de Hollanda, interpretada por Cynara e Cybele, venceu o festival, a despeito das vaias da plateia, que preferia a canção de Vandré, interpretada pelo próprio autor e notabilizada como hino contra a repressão política da época. A música teve sua execução proibida pela ditadura militar brasileira. Mas muito mais que isso, ela se tornou por muitos anos o “hino nacional “, entoado ainda hoje em várias situações. O ano terminou com a edição do AI 5. A repressão chegou ao auge.
Nesse tempo, as notícias cá chegavam pelo rádio, jornais e revistas, em especial, O Cruzeiro, entregue pelo saudoso Lamartine Leite. Mas isso não foi motivo para não aflorar o desejo de realizar sonhos. Assim, a partir da ideia de um jovem idealista, o então universitário, Walmor Júlio Silva, com o apoio de amigos, o ET circulou pela primeira vez no dia 1º de novembro desse ano mágico, 1968, Dia de Todos os Santos. O Jornal O Estado do Triângulo completa pois, 45 anos de circulação ininterrupta.
Nesse tempo todo, muita coisa ficou para trás. Os embates para a criação do Estado do Triângulo – que deu origem ao nome do veículo - vão e vêm. Mas muitas revoluções houve na cultura, arte, música, cinema, política, guerras, ciências, tecnologia, história. A geração envelheceu o corpo, mas as mentes continuam abertas à história e à cultura, como o recente Festival de Inverno do Parque Náutico de Jaguara, graças ao trabalho de Ivan Barbosa, outro amante da cultura.
O ET nasceu forte, porém, humilde, com os pés no chão, passo a passo, engatinhando com circulações mensais por muitos anos; debutou e atingiu a maioridade já quinzenal e assim tornou-se balzaquiano e, enfim, semanal. Mas o mais importante de tudo isso é que, sobretudo, o ET, nesses 45 anos se faz presente no registro da história local e da região.
Nesses anos todos, com sua independência habitual, e que não abre mão, tem sido a voz dos que muitas vezes têm que se calar. Viveu emoções de nascimentos, formaturas e casamentos. Chorou e solidarizou-se com amigos e a população em geral nos momentos de perdas.
Acompanhou vitórias e derrotas na política e no esporte. Fez versos de amor, saudades e até preces. Foi muitas vezes criticado e até alvejado; menino travesso, menino do Borá; brilhou na passarela do samba; embalou casais nos bailes da personalidades, teve musa, teve sonhos, realizações, vontade de viver e viveu. Vive com a intensidade e o gáudio dos sonhos da geração de 1968, uma geração que deixou a sua marca nos anais da história mundial.
Maria Elena de Jesus