Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

Quem vale mais, Tiradentes ou Zumbi?

Edição nº 1337 - 23 Novembro 2012

A bela comunidade negra sacramentana, que tão relevantes serviços prestou e presta ao município, desde os seus primeiros faiscadores de ouro, que aqui chegaram bem antes da Abolição da Escravatura, já dando duro nas terras do Desemboque ou nas barrancas do ribeirão Borá, às lides de hoje, no campo e na cidade, no comércio e na indústria, no magistério e nas profissões liberais merece esse tributo de nossa sociedade, ao reconhecermos o dia 20 de Novembro, Dia Nacional da Consciência Negra, como um feriado municipal. 

 

Falo isso porque, há bem pouco tempo, algumas autoridades negaram esse direito,ao responder a uma reivindicação de nossos afro descendentes, com a pífia justificativa de que “a cidade já continha feriados demais”. 

 

A resposta, com certeza, não foi unânime de nossa colenda corte legislativa, mas com certeza, também, aqueles que negaram esse direito à população negra da cidade, não levaram em conta o significado especial para os negros brasileiros desse mito, Zumbi, filho do Quilombo dos Palmares, e símbolo de luta pela liberdade de seus irmãos e da resistência ao jugo português, ainda no século XVII. 

 

Zumbi se iguala a Tiradentes, que tem sua data reconhecida, nacionalmente. Os ideais de ambos, assim como de Martin Luther King, herói negro que enfrentou a política de segregação norte-americana e por ela foi assassinado; assim como de Nelson Mandela nos anos 60, herói do movimento anti-apartheid, na África do Sul, que, por essa causa humanitária, passou 27 anos de sua vida na prisão, são os mesmos. Com todo respeito, Zumbi mereceria muito mais um busto na cidade do que o folclórico João Canudo. 

A verdade é que há uma mancha sem fim de opressão e violência sobre nossos irmãos negros, e que cai em nossas costas pela conivência histórica. Ainda pairam em nossas lembranças os belos versos de Castro Alves cantados em nossos bancos escolares, a descrever o horror dos navios negreiros:

 

(...)Mas que vejo eu aí... Que quadro d'amarguras! É canto funeral! ... Que tétricas figuras! ... Que cena infame e vil... Meu Deus! Meu Deus! Que horror! (...)

 

Passivamente assistimos a esse “sonho dantesco” por mais de 300 anos, calados, emudecidos. Ainda me lembro, nos anos de juventude, quando me envergonhava por conta de alguns amigos ‘pretos’, barrados à entrada do Sacramento Clube, 'terra sagrada' dos brancos. Sem lembrar dos horrores ocorridos entre a casa grande e a senzala e tantos outros direitos que só lhes chegaram, aos poucos, depois de 1888. 

 

Quando a presidente Dilma sancionou, recentemente,  a Lei das Cotas nas universidades, concedendo 25% do total de vagas das cotas aos estudantes negros, houve quem criticasse esse ato, de reverter esse racismo histórico que perdurou por mais de três séculos. Mas é assim mesmo, ainda hoje há quem não reconheça que os negros foram vítimas de discriminações e racismo nas suas interações com a sociedade.

 

Vai aqui outra 'Boa Ideia' aos nossos legisladores, para repararem esse equívoco, concedendo esse feriado municipal através de lei. Ainda que seja facultativo, trata-se de um reconhecimento mais do que justo a esse grande herói, Zumbi dos Palmares, e a toda a comunidade negra sacramentana.

 

(WJS)