A senhora está no plano superior
e tenho a certeza de que dará risadas
com o meu desabafo.
Sábado passado, à tarde, quando abri
a janela do meu quarto,
havia um grande vazio à minha frente...
Sua casa estava sendo demolida, Dande!
Comovi-me e lembrei-me do mestre
Adoniran Barbosa que teve a mesma
sensação que eu, quando viu
sua “”saudosa maloca” sendo destruída,
e cantou assim:
“...que tristeza que nóis sentia
cada táuba que caía
duia no coração .”
Ah, Dande, que saudade!...
Saudades, quantas saudades!
Das muitas festas que fizemos
em sua casa e a senhora,
a anfitriã perfeita.Sempre preocupada
em nos servir o melhor que tinha,
deixando-nos à vontade e participando
alegremente das nossas conversas
às vezes vãs, sem nenhum sentido.
Que saudade de ouvir a Adelina Magnabosco
adentrando-se todos os dias pela porta da sala
que nunca foi trancada, trazendo alvissareiras
notícias da cidade, da prefeitura, do Dr. José Alberto,
da igreja e “otrascositas más”...
Da Rede Vida na sala, funcionando diuturnamente,
monitorada pela tia Linda lá em Campinas.
A senhora e Altair com o terço na mão,
orando pelos que pediam e pelos que não
pediam suas orações.
E a Altair zelosa, abnegada e eficiente,
vigiando-a a cada passo.
Saudade das brincadeiras do Afonsão
sempre às “turras” com a Lindinha
que não se calava para ele.
E a senhora tomando o partido do amigo:
“ a Linda não tem jeito!”
E a Branca, a Badiinha,a Magrela e a Iara?! Affff!...
Quantos namoricos no seu alpendre!
E o doce de mamão servido
lá na cozinha, hein Walmor? Putz...
Ninguém nunca mais fez igual
ao seu e o de D. Esperança.
E o Dr. Rominho com a Edina?
Sempre prontos a acudi-la e a Altair,
a qualquer hora que chegassem
à janela e os chamassem.
Embora com a cabecinha de 90 e tantos anos,
nunca se esqueceu de perguntar-me:
“E a Zizi?
Está boa? Estou com saudades dela!” .
(eu também, Dande!!!).
Esperando no alpendre...
Lá estava ela.
Esperando quem? O que? Quando?
Só Deus sabe.
E os parentes queridos de São Paulo
que iam para a fazenda e passavam
primeiro pela “pensão da Dande”?
Quanta alegria em recebê-los!
Saudade da sua fala mansa,
cheia de sabedoria e alento.
Daquele abraço acolhedor
que sempre nos consolava
nas aflições e pesares.
Da sua presença no meu aniversário,
fazendo-me uma visita rápida,
mas sem jamais esquecer-me.
Saudadesdas palavras doces
e cheias de sabedoria
que nos colocavam para cima
e nos fazia crer que éramos
poderosas, bonitas, e não
tínhamos concorrentes.
Éramos as melhores aos seus olhos.
Ah, Dande!
Que saudade daquela força que nos
passou quando a Celminha, o Jairo
e o Zezé nos deixaram.
Ao invés de consolá-la,
fomos consolados.
Chega!
Não foi para reclamar e chorar
o que passou que invoquei
a sua lembrança.
Lembrei-me da senhora, Dande,
como sempre, foi para dizer-lhe
que apesar dos escombros,
nosso amor, amizade pela família
e nossa saudade não serão destruídos.
Os laços que nos unem são mais potentes
que o barulho e a frieza de uma máquina implacável.
O eco de seu amor ressoará
para sempre em nossos corações.
É o “pogresso” Dande!
O Ronaldo Zago que comprou a sua casa
é um homem de bem.
Também foi criado por uma mãe-coragem
que lhe ensinou os princípios básicos da vida:
amor, honestidade e trabalho.
No lugar onde foi sua casa,
ele erguerá um prédio imponente,
bonito, moderno e que servirá
da alicerce para seus descendentes.
Esta família será feliz e realizada
no local onde a senhora lançou
as sementes do amor, do bom senso,
da sabedoria e da perseverança.
Quando pensamos ter encerrado
um ciclo evolutivo, a surpresa nos
pega e nossa vida é sacudida
e modificada.
Dentre em breve a casa
dosBrigagão também poderá ser
demolida e tomara a Deus,
a nossa falta seja sentida como a sua
e de sua família respeitada e querida.
Dande querida, que fraqueza a minha, né?
A senhora nunca se preocupou com
as coisas materiais, elas não tinham valor para si.
cuidava sim, das coisas divinas
que iriam garantir o seu lugar junto do Pai.
Por enquanto, nós aqui ainda peregrinos,
vamos continuar lamentando nossas perdas,
porque continuamos imperfeitos e egoístas.
Mas esperamos encontrá-la um
dia para continuarmos a nossa
festa na “casa da Dande”
que nunca será desfeita
em nossa lembrança.
Aqueeeeele abraço!
Sandra Almeida