Quando criança ficava observando com curiosidade o que minhas avós guardavam naquelas caixas de camisas ou de sapatos. Via por vezes tirarem algumas cartas de dentro de envelopes amarelados que vinham colados a fotografias em preto e branco, quando não aqueles binóculos que escondiam os retratos.Havia convites de formaturas, casamentos, festas de crianças, enfim, uma infinidade de amontoados.
Cresci intrigado com aquilo. Por que depositam elas tantos penduricalhos ali?
Hoje quando nos deparamos com a chegada rápida da modernidade, onde cartas foram substituídas por e-mails e fotografias impressas por arquivos em cds, nos bate aquela saudade das caixas de papelão de nossas avós, que em alguns casos, foram elas próprias substituídas por algo mais criativo, mas não deixaram de guardar a essência do que lá continham.
Certamente ali estavam armazenadas parte das suas histórias de vida, que eram compartilhadas pela família e pelos amigos.
Então, podemos nos perguntar: não existem mais as caixas? Sim, elas existem. E todos nós temos nossas caixas de sapatos - ou algo parecido - onde guardamos as nossas preciosidades, sendo que todas as vezes que as remexemos somos tocados pela emoção do ontem, que o tempo não é capaz de destruir, nem mesmo diminuir.
Lá estão as nossas lembranças, nossas saudades, nossas perdas e nossos ganhos, de uma vida inteira, quem sabe.
Quem não tem sua caixa de recordações, talvez não tenha recordações, nem histórias a contar. Mas ainda há tempo de cada um ter a sua.
Guardar nossas ''coisinhas'' nessas caixas nos faz bem, principalmente quando lembramos de retirá-las para revermos nosso tempo de escola, os amigos e a bicicleta da infância, um familiar que se mudou e esqueceu de mandar notícias; manusear velhos rabiscos e papéis que de alguma forma significaram nossa existência, isso tudo nos obriga inevitavelmente a uma volta ao passado, que quase sempre é feliz, mesmo que mareada por lágrimas. Isso nos faz mais homens e menos máquinas.
Pode-se dizer, até com certa razão, que as melhores lembranças estão guardadas na memória e no coração de cada pessoa. Mas certo é que os guardados nas caixas de papelão nos fazem resgatar justamente o que está por lá armazenado e que dificilmente conseguiríamos detectar com a riqueza de detalhes que a lembrança nos impõe.
O importante nessa vida é ser feliz, incondicionalmente feliz. Viver cada emoção, cada dificuldade, cada busca, cada encontro, com os pés ao chão, mas com a alma leve, guardando no coração cada momento que vivemos, sem nos esquecer de alimentar aquela caixa de recordações.
Como nossas avós eram sábias ao terem suas caixas de sapato.
(*)Bruno Cordeiro é advogado e está vereador em Sacramento