A arquivista da Prefeitura, Eliane Vilas Boas, falou a ET sobre a importância dos tombamentos nos cemitérios, o que ocorreu recentemente com o Cemitério São Francisco de Assis, tombado ao Patrimônio Artístico e Histórico do Município, através do Decreto 376, assinado pelo prefeito Wesley De Santi de Melo.
De acordo com arquivista, desde os tempos mais remotos, túmulos representam uma rara fonte de pesquisa arqueológica e histórica. “Isso se explica porque neles eram, antigamente, sepultados diversos objetos artísticos e utensílios de uso cotidiano os quais, segundo as antigas crenças, deveriam servir ao morto no mundo eterno aonde ele tinha ido morar.
Exemplifica sua importância informando que séculos ou mesmo milênios depois, esses depósitos funerários deram origem à ciência da arqueologia. “Desde o Vale dos Reis no Egito até aos cemitérios maias, desde os jazigos normandos até às cavernas tumulares dos judeus, foram desenterrados objetos que, uma vez estudados, serviram à posteridade no sentido de permitir retratar o caminho seguido pelas culturas passadas”.
Eliane diz mais que eles podem representar não somente um objeto de profunda veneração familiar e religiosa, mas também como fonte histórica.
“- Senão todos, pelo menos alguns túmulos condensam em suas linhas, quer pomposas quer simples, as crenças religiosas, os usos e costumes, as relações sociais, as esperanças ou frustrações de sucessivas gerações. Podemos falar de uma arte tumular, ou seja, a arte de edificação e decoração dos sepulcros; de uma arquitetura tumular, e até mesmo de uma psicologia dos túmulos”.
Sobre esses detalhes, ela explica alguns significados interessantes. “Túmulos luxuosos, de grandes dimensões, traduzem um desejo, aliás algo insensato aos olhos de um cristão, de prolongar na eternidade a grandeza vivida por seu ocupante no mundo terrestre; enquanto sepulturas simples, ao contrário, despidas de ornamento e muitas vezes colocadas ao nível do chão e recobertas por um canteiro de flores ou por grama, deverão expressar humildade perante o braço inexorável da morte e simultânea confiança na misericórdia divina”.
Eliana cita como exemplos os cemitérios medievais e renascentistas da Europa. “Os cemitérios de Pisa e o de Gênova, onde pinturas e esculturas do mais fino lavor nos transmitem uma imagem riquíssima da cultura daqueles tempos e do modo como ela encarava a mortalidade inerente à condição humana”. Lembra ainda outros monumentos fúnebres milenares, como as pirâmides do Egito e o famosíssimo 'Mausoléu de Halicarnasso', erigido pela viúva do rei grego Mausolo.
Destaca também a arquivista a importância das inscrições tumulares, os chamado epitáfios. “Reza a lenda que no túmulo de São Paulo bem caberia aquilo que o apóstolo das gentes disse a respeito de si mesmo: “Combati o bom combate; e tendo agora minh'alma posta em outras coisas, aguardo a coroa da justiça”.
‘‘Os túmulos pagãos, gregos e romanos, sobretudo, deles - explica - pôde a história extrair conhecimentos abundantes que vão desde o patriotismo dos espartanos que jaziam nas Termópilas sacrificados à sanha dos bárbaros invasores até à justa revolta de Cipião, o Africano, contra seus ingratos concidadãos’’.
“É por isso – conclui Eliane - que a arqueologia tem tanto a dever aos túmulos; é por isso, obviamente, que eles podem e devem ser objeto de atenção especial sempre que seus ocupantes forem representativos da sociedade em que viveram. E finaliza com uma pequena lição:
“- Jamais devemos considerar os túmulos como “a morada dos falecidos”; e neste sentido Jesus Cristo foi bem claro ao interrogar: “Por que procurais um vivo entre os mortos”.
Em escala bem menor, percorrendo o Cemitério Municipal S. Francisco de Assis, agora tombado, podemos sentir tudo o que Vilas Boas fala. Por outro lado, a sua preservação pelo poder público deve também ser levada em conta. O ET fotografou, desde o primeiro túmulo construído, a alguns outros, o lamentável estado em que se encontram, cabendo pois uma intervenção por parte do poder público.