Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

Depois de 45 anos, Levy vem rever amigos

Edição nº 1543 - 4 Novembro de 2016

Levy Israel das Chagas e os irmãos, Wagner, Josué e Diomira Mendonça, quatro músicos que, para as novas gerações, são bons cidadãos e amigos. Entre os adeptos da boa música, Wagner ainda é conhecido pelas aulas de violão e pelo clássico dedilhar de belas músicas em apresentações na cidade e em vídeos. Josué, igualmente, é bem conhecido, no seu ir e vir pelas ruas centrais e, mais agora, no Expresso  Boiadeiro, onde faz dupla com o sobrinho Rodrigo. Diomira, mais caseira, à época, com sua doce voz era a cantora do conjunto.  Já Levy, conhecidíssimo  pelo seu talento nos anos 60, sumiu nas andanças pelo mundo...

Mas o que esses três músicos têm em comum, além da amizade? O trio são os últimos integrantes de uma das históricas e inesquecíveis bandas da cidade: Os Tremendões, criada em 1968, composta pelos irmãos Mendonça, Wagner (guitarra solo e base), Josué (guitarra base) e Lorim (violino) e ainda, Levy, Dutrão (contrabaixo), Levy (guitarra e voz) e Bandoleiro (bateria). Em 1970, a banda mudou o nome para The Red Stones, com nova formação, incluindo a cantora Diomira, irmã dos Mendonça.
 Em 1971, a banda chegou ao fim e cada um seguiu seu rumo. Levy seguiu para outras terras, e haja terras visitadas pelo músico que incorporou no seu vasto ecletismo instrumental, a sanfona, que não cabia nas então bandas dos anos 60.
E lá se vão 45 anos... No ponto de vista da Sociologia, duas gerações se passaram até que Levy voltasse à terra que o recebeu com tanto carinho naqueles gloriosos anos 60, acompanhado da esposa Lílian e de outra inseparável companheira, sua sanfona Todeschine.
“- O que vale da vida é a valorização daquilo que a gente viveu, as pessoas que conhecemos e com as quais convivemos e aprendemos algo”, disse ao ET, numa entrevista na casa dos irmãos Mendonça, onde executou belas canções no acordeom e recordando belos sucessos da época, além de uma palinha da soprano  Lilian, soprano interpretando 'Além do arco Iris'.
 Para Diomira, o reencontro trouxe grandes recordações. “A emoção é grande, muita coisa para recordar.  Foi uma felicidade para todos nós”. Wagner Mendonça não teve palavras para definir o reencontro, mas as lágrimas de emoção disseram tudo.

 

Levy, um músico autodidata e uma grande história de vida

Natural de Lagoa da Prata, Levy Israel das Chagas,  um expert em instrumentos musicais, relataria toda sua historia de 64 anos de vida, se tempo e espaço tivesse. É um exímio músico e bom conversador. Ainda assim deu uma pincelada de suas andanças até fincar pé em Uberaba.
Levy saiu de casa aos 12 anos atrás de um circo, o Spano Brasileiro e rodou o Brasil. “Circo tinha aqueles show com artistas, os dramas... E foi justamente o drama, 'Punhal da Vingança', de Zé Fortuna e Pitangueira, que me levou para o mundo mágico do circo. Saí de casa e fui embora com eles e vivenciei muitos shows com Tonico e Tinoco, Praião e Prainha, Silveira e Barrinha... 
Mas, no circo me perguntaram o que eu sabia fazer e eu disse que era músico. Afinal desde os seis anos eu tirava sons de tudo que visse. Aí me mandaram fazer parte da orquestra.  Só que eu não sabia tocar instrumentos, aliás, nunca tive aulas de música. Aí  juntei latas, panelas, garrafas e fui treinando até afiná-los. Eles fizeram um suporte e  passei a ser músico do circo e fiz sucesso com as minhas tralhas.  Foram muitos anos de circo, até que um dia chegamos a Uberaba.
Naquele tempo  o dono do circo e artistas ficavam na portaria recebendo os bilhetes de entrada, e num entrevero entre o dono do circo e um homem, ele atirou e matou o diretor. Desgostei. Saí do circo e sem teto, sem abrigo, fui pra zona, literalmente. Fui trabalhar na famosa rua São Miguel, e ali foi, entre mulheres da vida e travestis, minha maior escola, porque era repleta de músicos. E fui aprendendo...”. conta.
Levy chegou aos Tremendões meio que por acaso. “Cheguei a Sacramento com uma sanfona nas costas pra tocar pra um barbeiro, o Marinho. Na barbearia ele me falou que havia um conjunto na cidade e me trouxe aqui nessa perto da escola, onde moravam os irmãos Mendonça. Assim que me apresentou, o Wagner disse:
“- Sanfona aqui não tem vez”. E me mostrou três guitarras, que eram a base das bandas da época. Afinei aquilo e, pronto estava na banda...
Fizemos shows em muitos lugares, até em Goiânia e nesse Diomira não pôde ir,  porque tinha striptease (risos). Tive de cantar sozinho”, recorda com boas rizadas, lembrando que “as músicas internacionais eram uma graça, ninguém sabia inglês, francês... E  a Diomira era a responsável por elas. Ela pegava do rádio. Quando tocava a música ela ia escrevendo do jeito que falavam.
E nós  ensaiávamos e  mandávamos   ver no palco, e aplausos e mais aplausos.  Às vezes, tinha show e a música  não estava pronta, porque tinha que ouvir no rádio várias vezes, até escrever tudo naquele “portinglês”. Um tempo muito bom.  Um dia tudo acabou...”.
O reencontro de Levy com os amigos Wagner, Josué e Diomira foi graças a um amigo em comum, o neurologista Manuel Nunes, de Uberaba. “Ele é apaixonado por música e  sempre vai onde estamos tocando. E numa conversa informal, ele lembrou do Wagner. Foi quando pensei: 'Aqui, tão pertinho, vou rever os amigos, nessa altura da nossa vida isso é muito importante”.
Hoje, Levy reside em Uberaba com a mulher e segundo Lilian, unidos pela música. “Eu fazia conservatório e já ouvira falar de Levy, que tocava e cantava em diversos lugares em Uberaba. E eu era louca para conhecê-lo, até que um dia o encontrei cantando. Eu lhe pedi que cantasse Fascinação, mas ele 'entra em alfa'...
E não existe mais nada ao redor, quando começa a tocar. Enfim, ele não cantou para mim. Quando ele parou, levantou, tomou água, deu uma volta, voltou a tocar e nada da minha música. Dias depois nos reencontramos, começamos a conversar... E estamos juntos desde então, revela, elogiando a facilidade que Levy tem com música.
E de fato: em suas mãos os instrumentos falam...