“Não existe partida para aqueles que permanecerão eternamente em nossos corações”
Essa mensagem ilustra bem o sentimento de amizade e gratidão que sempre tive em relação à Marilea. Em outra máxima, essa do apóstolo Paulo, que aprendi com meus pais, diz muito de minha amizade com essa mulher que foi exemplo de vida: “Alegrai-vos com os que se alegram e chorai com os que choram” (Romanos, 12:15). Muito sorri com Marilea, muito trabalhei com Marilea, muito a visitei em seu aconchegante lar, sempre encontrando-a ao lado do devotado esposo, Amur. Horas de alegria e de júbilo passamos juntos... Alegrei-me com ela.
Nesse domingo, no entanto, minha alma pranteou a sua partida. Não pela certeza que tenho de sua eternidade nos braços do Pai, mas porque somos humanos e como humanos temos esse sentimento tão lindo da saudade expressada em lágrimas. Assim como chorei pela morte de meus pais e por tantos amigos que partiram... hoje verto também lágrimas por ela e pelo consolo de seu esposo e filhos.
Com fama de brava, sem ser autoritária, como educadora foi sempre idealista e autêntica, e sabia como poucas orientar seus alunos e administrar com maestria impecável nosso mais antigo estabelecimento de ensino, o Grupo Escolar Dr. Afonso Pena Jr. Na educação, ela deixou esse legado de mestra às gerações futuras pela formação de milhares de crianças que se tornaram grandes cidadãos na sociedade sacramentana. Bastava esse legado para aqui ser lembrada, a missão nobilíssima de educadora. No Afonso Pena a professora e diretora Marilea fez e é história.
Não estudei com Marilea, mas muito aprendi com ela. Com toda sinceridade de coração, posso dizer que Marilea foi minha segunda mãe, que se entusiasmava com tudo o que eu fazia, que espontaneamente se prontificava em me ajudar nos momentos mais difíceis, que esteve presente na minha vida e na vida de minha família, nas alegrias e tristezas. Foi com ela que aprendi que, “Para se viver bem é preciso saber engolir lágrimas e vaidades”.
Foi amicíssima de minha mãe. Eu me lembro, no velório de mamãe, velada em casa, Marilea foi uma das primeiras visitas que recebi e ali permaneceu até altas horas da madrugada, sequer atendendo ao pedido da família para se recolher. A ponto de eu interferir, pedindo-lhe que fosse descansar um pouco, ao que ela me respondeu com os olhos em pranto: “Vou ficar mais, porque quero prestar minha última homenagem a minha querida e verdadeira amiga, Carmelita”.
É importante a gente conviver com pessoas que entendem nosso pensamento, ela sabia do que eu gostava. Ela açambarcava todos os meus ideais. Na última visita que fiz a essa amiga inesquecível, já internada na Santa Casa, percebi que ela estava nos deixando. Deixei minha bênção como amigo e filho aspergindo-lhe água benta e orando a Deus para que lhe desse uma santa morte, por tudo que representou nessa vida, pedindo ainda aos sacerdotes amigos que rezassem também por ela.
Ela não era uma mulher de frequência religiosa, mas guardava como ninguém as três virtudes teologais, a fé, a esperança e a caridade. De São Tiago, temos as palavras sábias: “A religião pura e imaculada para com Deus, o Pai, é esta: 'Visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações, e guardar-se da corrupção do mundo'”. E ela tanto ajudou a raça negra em nossa cidade, em especial nas atividades festivas do Clube XIII de Maio.
Deixo, por fim, meu testemunho da ajuda prestada por essa mulher talentosa, nos três mandatos que exerci como prefeito de Sacramento. Desde as pequenas às grandes obras, pude contar com aquela assessoria espontânea e voluntária, aliada ao seu bom gosto.
Pude tê-la no cerimonial da inauguração do prédio da Prefeitura; na concessão de título a Dr. Marcos Vale Mendes Jr; na festa do Sesquicentenário, em 1972, com as demais diretoras; na inauguração do Poliesportivo Marquezinho e cerimônia cívico-religiosa com a concelebração da missa presidida por Dom Benedito de Ulhoa Vieira.
Organizou e coordenou os trabalhos do 1º Concurso Regional de Fanfarras Escolares em Sacramento, quando se apresentaram 36 fanfarras das diversas cidades da região. Ajudou-me na escolha dos símbolos municipais: a Bandeira e o Escudo; coordenou as cerimônias das inaugurações da Rodoviária e da Gruta dos Palhares.
Sempre com muito bom gosto e o maior esmero. Fez um trabalho lindíssimo na inauguração da Biblioteca Dr. Valadares da Fonseca e reforma da Casa da Cultura, onde sancionei a lei que proclamava Na. Sra. do Patrocínio do Ssmo. Sacramento como padroeira da cidade.
E tantas outras festividades cívicas ligadas ao governo. Na Prefeitura, prestou um valor inestimável na organização e arquivamento de documentos, homenagens e fotos que passaram para a história... Se existe hoje um documentário farto de meu governo, com fotos, discursos e homenagens, devo esse legado histórico a essa mulher.
Tantas outras obras e serviços que pudemos realizar, lá estava Marilea, sempre com o maior carinho, a maior dedicação e o melhor bom gosto. E tudo isso, faço questão de ressalvar, como um trabalho voluntário, por amizade. Fomos sempre uma família muito unida, a quem reverencio, desde seu pai, Fozo Maluf, sua mãe, a Profa. Corália Venites, uma das mulheres mais cultas que conheci.
Em mim fica, sim, este vazio... Mas, fortalecidos, seguiremos nossa jornada, conscientes de que Jesus prossegue a nos guiar e a nos mostrar que a morte não significa chegar ao fim, mas descobrir que o fim, em verdade, é apenas um novo recomeço, o recomeço para a vida eterna.
Do sempre amigo,
José Alberto Bernardes Borges