O professor de Filosofia Fabiano Batista Leite, 33, foi vitima de agressão física durante excursão ao Rio de Janeiro, nos feriados da Semana Santa, de 17 a 21, por alguns dos 215 passageiros que participaram da viagem. A um custo de R$ 450,00, com direito à hospedagem, café da manhã e uma refeição, a viagem só foi possível graças a sua ligação com o Instituto Iracema Tolentino e Grupo Anistia.
“- Sou um agente modificador social e cultural, num projeto cultural do terceiro setor, que permite que as pessoas adquiram por um preço irrisório a condição de participar de eventos culturais, fazer viagens culturais. O projeto não tem intenção mercantilista, muito pelo contrário, financia boa parte das viagens através de recursos da Lei Rouanet, de incentivo à cultura ou seja, o Instituto capta recursos entre multinacionais para financiar a participação em eventos culturais”, explica.
Segundo o professor, “a viagem visou dar a oportunidade de as pessoas conhecerem o Rio de Janeiro, uma das cidades sedes da Copa do Mundo e, em 2016, das Olimpíadas e, sobretudo, a oportunidade de conhecer os pontos turísticos da cidade maravilhosa, que continua linda”.
Há dois anos na cidade, o Prof. Fabiano Leite, por três vezes, levou alunos e professores para a participar de eventos culturais: primeiro, na Temporada Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo - OSESP/2013, na capital paulista, que homenageou a Sagração da Primavera, obra de Igor Stravinsky, oportunidade em que visitaram o Museu da Língua Portuguesa e a Pinacoteca; o segundo evento foi também em São Paulo, para assistir Vivaldi.
Outra excursão, em Brasília, para assistir às Narrativas Poéticas do Museu Nacional e observar a montagem dos painéis do projeto Ausências Brasil, na secretaria dos Direitos Humanos da Presidência da República (SDH), mostrando os fatos obscuros da história do Brasil e da Argentina nos tempos da ditadura militar.
O Rio de Janeiro continua lindo, mas...
O mesmo não aconteceu no Rio de Janeiro, quando uma série de contratempos provocou insatisfação dos passageiros, com alguns chegando ao extremo de agredi-lo verbal e até fisicamente, conforme comprova exame de corpo de delito feito pelo professor ao retornar a Sacramento.
De acordo com Fabiano, cada viajante pagou R$ 365,00 de passagem, mais R$ 85,00 de alimentação e hospedagem. “Uma viagem dessas não ficaria por menos de R$ 800,00, mas o restante foi pago pelo terceiro setor. Todos receberam o roteiro, constando as condições do local, sites para consulta, enfim todas as informações necessárias. Cada ônibus tinha um coordenador, ou seja, tudo organizado dentro do previsto. Inclusive todos foram informados sobre eventuais atrasos devido ao feriado prolongado, que causa lentidão no trânsito e, de fato, o trânsito estava uma efervescência. Saímos às 20h e chegamos ao Rio por volta das 9h da manhã do dia 18.
Problemas começaram na chegada...
O alojamento foi no Espaço Carapiá, na Pedra de Guaratiba, um local com capacidade para 340 pessoas. “Éramos 215. Na chegada, houve um certo tumulto para a escolha das suítes e quartos, mas foi contornado, até pelo bom senso de cada um”. No mesmo dia, mais dois contratempos aconteceram à tarde: o primeiro, quando os ônibus que levaram os turistas à Praia do Recreio dos Bandeirantes se perderam por duas horas. O segundo problema, foi a falta de água quente para o banho em algumas suítes. “O espaço reservado, embora constasse que tudo estaria ok, não havia água quente para o banho. O pessoal, claro, ficou nervoso, mas um eletricista sanou o problema”. Mas, segundo Fabiano, ao tentar conversar com algumas pessoas, acabou agredido verbalmente.
Na manhã do sábado, a situação complicou no café da manhã, preparado dentro do proposto: pão, manteiga, café, leite, frutas, bolos e tortas. Resultado, os últimos ficaram prejudicados, porque, segundo Fabiano, muita gente carregou uma boa quantidade de comida para o próprio quarto. “Não pensaram em nenhum momento no outro”.
Problemas também ainda no sábado, na hora de ir a Parati com o grupo que optou pela viagem, que acabou não acontecendo. “Os outros desfrutariam do lazer na mansão e na praia próxima. Mas não foi bem assim e houve mais farpas verbais”, como Fabiano define. Outra agressão o professor enfrentou no sábado de um dos turistas, por conta de problemas que teve ao abrir a suíte.
“Mais tarde, após o jantar, tentamos conversar, acalmar os ânimos para que todos aproveitassem bem a viagem, independente desses problemas, mas não surtiu efeito. E, para agravar a situação, diante de tanta exasperação e reclamação, o pessoal que levamos daqui pra preparar as refeições se recusou a continuar na cozinha, pois todos ficaram apavoradas, com medo. Tive que contratar cozinheiras no local. Na verdade, haveria bufê todos os dias, mas foi cancelado, por falta de pagamento, porém todos foram avisados. Com isso muitos se sentiram prejudicados e reclamavam, porque os que não pagaram, estavam comendo. Mas nós vamos devolver os R$ 85,00”, promete.
No domingo, Fabiano sofreu a primeira agressão física
Para Fabiano, o mais decepcionante foi o fato de alguém do grupo ter furado a mangueira do gás de cozinha e os pneus do veículo usado para as compras. “Na hora de fazer o café da manhã, no domingo, cadê o gás? Fui ao carro pra buscar gás e o pão, os pneus do carro estavam literalmente retalhados. Não sei quem foi, mas alguém, do grupo fez isto, porque ninguém mais tinha acesso ao local a não ser nós mesmos. O café atrasou, mas depois todos saíram para a praia e retornaram à tarde para o jantar”, narra.
De repente, algumas pessoas começaram a manipular outras para que um dos ônibus viesse embora mais cedo e, depois de muita discussão, eles de fato, vieram mais cedo. Nós acertamos que os outros quatro ônibus sairiam pela manhã. Só que nesse ínterim, um dos integrantes se levantou, me agarrou pela camisa e me jogou no chão. Levantei atordoado e ele e outras pessoas começaram a pedir o dinheiro de volta. Expliquei que a viagem faz parte de um projeto e que o dinheiro seria devolvido e vamos devolver para todos”.
Segundo Fabiano, ele acionou a polícia e foi lavrado um BO da agressão, mas os ânimos continuaram exaltados. Até que, por volta das quatro horas da manhã, outra grave agressão. “Estávamos nos preparando para a viagem de retorno e eu conversava com uma das pessoas, quando fui pego de surpresa por um dos integrantes, que me agarrou pelos braços na escada para eu ir até a suíte deles pegar as malas e descer. E de repente, ele me agarrou pelo pescoço, jogou-me no chão e passou a me dar socos e pontapés. Fiquei completamente atordoado”, narra mais.
Fabiano foi acudido por outros passageiros e se refugiou no banheiro, onde permaneceu até os ânimos se arrefecerem. “Tive vômitos, sentia muita dor, mas eu sentia que teria de ser forte, porque se chamasse a polícia ou procurasse um médico, todos seriam levados para a delegacia e a maioria das pessoas nada tinha a ver com o caso, que foi causado por um grupo de pessoas apenas. Inclusive muitas pessoas ficaram revoltadas com a situação”.
A viagem de volta foi também para o Prof. Fabiano de constrangimento e muito medo. “Diante das ameaças feitas pelo grupo, que afirmava que iria me matar, com palavras do tipo: 'Vamos acabar com a sua vida'. Aí fui orientado por amigos a permanecer no ônibus. Por receio e para não colocar mais ninguém em risco, resolvi ficar sempre dentro do ônibus durante as paradas. Um amigo me buscou em Rifaina e me trouxe até Sacramento”, disse, mostrando os hematomas pelo corpo. Ao chegar a Sacramento passou por um médico e fez exame de corpo de delito para providências futuras.
Apoio da família e de amigos
Apesar de residir sozinho em Sacramento, Fabiano tem família e amigos, que vieram buscá-lo na quarta-feira e levá-lo para São Paulo, onde vai passar por novos exames e se recuperar tanto das agressões físicas quanto psicológicas. Mas antes foi acolhido por amigos na cidade.
Falando ao ET, disse o professor que se sentiu horrorizado com o comportamento do grupo. “Nenhuma ausência ou falha justifica a violência. Há mais de dois meses conheço as pessoas desse grupo da viagem, tinha por elas a mais alta estima e hoje vejo que as mesmas mãos que nos aplaudem, também nos podem ferir”, afirma.
“- Sei que incomodo as pessoas, porque minha presença perturba enquanto filósofo. Posso entender que cidades pequenas, normalmente também são provincianas, com mentes provincianas. Mas isso não é um mal. O mal está em não reconhecer um projeto inovador, permitindo uma abertura da mente, além de um afinamento cultural e de conhecimento. Este é o papel do filósofo, esmiuçar circunstâncias, pessoas e transmitir o olhar filosófico, que discerne e mostra fatos que estão encobertos e que muita gente não tem percepção. Minha presença perturba a paz de cemitério, que é onde todos ficam calados”, analisa.
Continua agendada excursão para Bariloche
A viagem para Bariloche, na Argentina, também programada pelo Prof. Fabiano Leite, continua agendada, para o mês de junho. “O projeto existe, a viagem está pronta e vamos cumprir a programação. A única coisa que tenho receio hoje é da minha vida”, afirma, lamentando mais uma vez as agressões sofridas.
“- Já vivi e trabalhei entre índios, em favelas, com comunidades na África e nunca vi, vivi nem nunca experimentei tamanha violência como vi entre alguns dos ditos civilizados. Foi lamentável, porque estávamos num grupo de pessoas amigas, com o objetivo de viver um final de semana maravilhoso. Mas não, até por comida houve confusão, e atitudes que não são esperadas vindas de pessoas civilizadas ”, afirma garantido que o projeto vai devolver aos que se sentiram lesados os R$ 85,00 referentes a alimentação e alojamento.
Quem é o Prof. Fabiano Leite
Fabiano tem licenciatura, bacharelado em Filosofia e mestrado, também em Filosofia, pela Universidad Navarra, na Espanha, através do programa World Vision International. Possui curso complementar pelo InstitutoMetodista Izabela Hendrix e estudou no Seminário Maior em São Paulo. O Prof. Fabiano é um cidadão do mundo, realizando trabalhos sociais e culturais, através do Instituto Tolentino e Grupo Anistia aos quais está ligado há mais de dez anos.
Fabiano chegou a Sacramento há dois anos com objetivos profissionais e, também de incentivar a cultura local. Cronista e pensador, Fabiano publica, periodicamente, seus textos no ET.
“- Vim para Sacramento pelo terceiro setor, como professor e alterador da cultura local, para que possamos através do fomento otimizar a cultura sobretudo entre estudantes. Lembrando que o terceiro setor é constituído por organizações sem fins lucrativos, não-governamentais, que têm por objetivo gerar serviços de caráter público”, explica.
Passageiros recorrem ao Procon
Nas redes sociais os comentários negativos são vários, apenas um ou outro defende o organizador, justificando o irrisório valor pago pela excursão. O ET conversou com a Profa. Cirlene da Glória de Melo Borges, que viajou com o grupo e que confirmou as denúncias feitas. Passando ao ET uma cópia do contrato, afirma que nada do proposto foi cumprido e que por isso o grupo está recorrendo ao Procon.
Com o contrato em mãos, a professora aponta algumas irregularidades, a começar do local do alojamento. “O Espaço Carapiá não fica na Barra da Tijuca, conforme contrato, mas em Guaratiba, bem mais longe da cidade. A saída seria no dia 17 às 19h e o retorno no dia 21, após o almoço. De repente, ele decidiu que retornaríamos às 4 da manhã e acabamos saindo por volta das 6h. Para piorar, um dos ônibus quebrou e só chegamos aqui na manhã da terça-feira”.
De acordo com Cirlene, consta no contrato que os ônibus estariam levando os turistas à praia da Tijuca às 10h e retornando às 18, porém, por falta de guia, os ônibus se perderam. No sábado, haveria uma viagem a Paraty, que era opcional, no valor de R$ 67,00, mas não houve. Haveria city tour no domingo (não inclusas as passagens), o que também não aconteceu. Teríamos direito a café da manhã e jantar, mas a comida foi bem escassa, ou seja, era pouca comida pra muita gente. Enfim nada do que foi proposto aconteceu e foi uma desorganização total e uma decepção geral”.
Cirlene reconheceu que o Espaço Carapiá é um bom local, mas ideal para festas e não para acomodar uma grande quantidade de pessoas por vários dias. “Atribuo essas irregularidades ao amadorismo do Prof. Fabiano ao coordenar esse tipo de excursão e o projeto ter envolvido tantas pessoas. Foi muita gente e um grupo muito heterogêneo, havia famílias inteiras, inclusive várias crianças, muitos jovens, idosos e as condições do que vimos lá não satisfaziam todos”. Segundo o Cirlene, o caseiro do Espaço, disse que estava esperando um grupo de 100 pessoas entre padres e freiras.
Sobre as agressões, Cirlene afirma que não testemunhou, apenas ficou sabendo, mas abomina a atitude dos agressores. “As coisas não são resolvidas dessa forma, com agressão, nada justifica. Vamos recorrer ao Procon, civilizadamente, e esse órgão vai resolver a questão ”