ET - José Alberto, como nasceu a ideia de criar a Festa da Padroeira da cidade e dedicá-la a Nossa Senhora do Patrocínio do Santíssimo Sacramento?
ET - José Alberto - Tudo nasceu há bem tempo. Quando eu era criança, o Sr. Mário Afonso Borges e o Monsenhor Saul Amaral, pároco da cidade, tinham a intenção de criar a Festa da Padroeira, mas nunca foi avante a idéia. Nossa principal festa era dedicada à Nossa Senhora d'Abadia, no dia 15 de agosto. Assim, quando assumi a prefeitura pela segunda vez, tive a idéia de realizar o sonho deles e proclamar Nossa Senhora do Patrocínio do Santíssimo Sacramento como padroeira do município. É fato histórico, narrado pelos historiadores que relatam esses acontecimentos da fundação da cidade, que Sacramento surgiu do assentamento de uma capela dedicada ao Santíssimo Sacramento apresentado pelo patrocínio de Maria, cuja imagem belíssima, vinda ainda de Portugal, segurando o ostensório, que repousa hoje no museu da cidade, esteve sempre em lugar de destaque desde que recebeu o seu orago, na fundação da cidade.
ET – O artigo 3° da Lei reza também que ficam proclamados ‘patronos’ do município, o Divino Espírito Santo, São Miguel Arcanjo e São Sebastião. Como o Sr. justificou esses nomes?
José Alberto – Bom, o Espírito Santo, também tem suas razões na tradição e na cultura religiosa e popular de nossa gente. Desde a criação do município, a Festa do Espirito Santo foi muito fervorosa. Os mais antigos contavam que era uma festa de grande concentração popular, reunindo as pessoas que tinham muita devoção ao Divino Espírito Santo e ainda hoje, fonte de bênçãos para toda nossa gente, não apenas católicos.
ET – São Miguel Arcanjo…
José Alberto – São Miguel não é por causa da devoção pessoal que sempre tive por ele, mas devido a influência do grande Papa Leão XIII (1810/1903), o primeiro papa a tratar em suas encíclicas, através da Rerum Novarum, da questão social. Ele pediu que se rezasse após a missa, a salve rainha, três ave-marias e a oração de São Miguel, devido a uma visão que ele teve. Foi quando ele compôs uma oração belíssima, que começava assim: “São Miguel Arcanjo, protegei-nos no combate, sede nosso auxilio contra a malícia e ciladas do demônio...
ET – Entre outros fatos, a diocese de Uberaba não foi instalada no dia de São Miguel?
José Alberto – Sim, foi. Nossa diocese de Uberaba foi instalada no dia 29 de setembro, dia de São Miguel e lá na catedral há uma imagem de São Miguel. E é bom que deixemos claro que ninguém adora imagem, nós as veneramos. Elas são como uma fotografia de um ente querido, que olhamos, veneramos e nos lembramos dos momentos felizes que passamos juntos. Assim são as imagens, esses ícones são uma lembrança dos santos. Mas há várias coisas que nos ligam a São Miguel um anjo que tem várias inserções tanto no Antigo Testamento, como no Apocalipse.
ET – Temos a Igrejinha de São Miguel no antigo 'Atrás do Morro'…
José Alberto – Sim, mas esta homenagem já foi feita bem próxima de nós. As homenagens a São Miguel remontam o início da cidade. O historiador Amir Salomão lembra que a primeira farmácia de Sacramento chamava-se Farmácia São Miguel. Tivemos também o Distrito de São Miguel da Nova Ponte, hoje Nova Ponte, que pertencia a Sacramento.
ET – São Sebastião…
José Alberto – Tem também um significado histórico e cultural para nós. Sacramento nasce ao longo das estradas de boiadas. A praça da Matriz , o Chafariz , a praça da Estação e até o Areião eram pontos de pousada de gado. Os corredores viam de norte, sul, leste e oeste e se encontravam em Sacramento, mostrando que o município crescia graças a sua exclusive economia agropecuária. Nossas riquezas todas vinham das fazendas e de toda a população do campo, que era grande devota de São Sebastião. Nossos fanzendeiros e colonos, todos o tinham já como padroeiro e defensor contra a fome, a Guerra e a peste. Antigamente não havia remédios, antibióticos, então as orações eram dedicadas a São Sebastião, contra todas essas moléstias. Ele era muito invocado antigamente, quando havia doenças na família. A Festa de São Sebastião era a festa dos agropecuaristas, uma das principais festas da cidade.
ET – Quando foi sancionada a lei?
José Alberto – Em um dia muito festivo. A Lei foi sancionada no dia 12 de outubro de 1980, na Casa da Cultura, quando inauguramos o acervo da Biblioteca Municipal e a denominamos de José Valadares da Fonseca, uma homenagem que prestamos a um grande medico, um homem muito culto e ex-prefeito de Sacramento. Ali, na presença de várias autoridades, diretores, professores e muitas outras pessoas, sancionamos a lei instituindo a Festa da Padroeira e os padroeiros do município de Sacramento.
ET – Fosse hoje, essa lei teria sido aprovada pela Câmara, como foi, por unanimidade, em um plenário formado por alguns vereadores espíritas?
José Alberto – Diante dos fatos históricos apresentados, dos valores cultivados pelas famílias que formaram nossa cidade, sua devoção e sua fé, eu creio que sim. Eu me lembro que o projeto foi aprovado por unanimidade. Todos reconheceram a história de Sacramento, que está ligada à fundação de uma capela dedicada ao Santíssimo Sacramento. Nossa Senhora era padroeira da paróquia, mas nós houvemos por bem colocá-la como patrona da cidade. E os vereadores entenderam muito bem essa importância.
ET – Você sempre foi devoto de São Miguel Arcanjo, contam, especialmente na Prefeitura, como prefeito…
José Alberto - É verdade! Eu sempre invoquei São Miguel Arcanjo, inclusive quando fui prefeito e tinha dificuldades na prefeitura. Eu o invocava e mandava hastear a bandeira e mandava celebrar missa. E posso afirmar que nunca deixei a prefeitura com dívidas... Quando eu mandava hastear a bandeira, o Toninho, funcionário da época, perguntava: “- Quem morreu, doutor?!”. Ninguém, Toninho, é pra agradecer a São Miguel!, eu respondia.
ET – O Luiz Devós outro dia lembrou no ET um fato que mistura devoção e coisa engraçada, quando você desafiou o Santo, aliás, o Anjo, em seu gabinete. Como foi esse fato?
José Alberto (rindo) - Eu me lembro muito bem desse fato. Isso aconteceu em 1992, nos últimos dias do meu governo. No dia 29 de dezembro, eu estava com mais ou menos uns trezentos milhões em caixa. Naquela época era 'milhões'. Contas em dia, 14° todo pago, dinheiro em caixa… E o meu tesoureiro, Luiz Devós, entrou em meu gabinete e disse: “- Doutor, o senhor tem pra receber 780 milhões que ainda não chegaram”. Eu, claro, perguntei: Por que? E ele respondeu: “Por conta da burocracia do sistema, as contas foram encerradas antes do Natal. E segundo o governo, o dinheiro só será liberado depois do ano novo, dia 4”. Mas no dia 4, eu não serei mais prefeito!, gritei. Eu quero esse dinheiro pra passar para o meu sucessor até depois de amanhã, quando encerra meu governo. E me pus ao telefone.
ET – Foi reclamar com o governador…
José Alberto – Não. Liguei para o nosso deputado majoritário, Anderson Adauto. Ele argumentou que eu havia feito o sucessor, não precisava me importar. E eu rebati que queria o dinheiro pra passar para o sucessor. E o Anderson disse que só no dia 4 de janeiro. E eu rebati: No dia 4 de janeiro, não sou prefeito mais. Olhei para a imagem de São Miguel, que sempre esteve comigo em meu gabinete. Levantei, fui até ele, bati a mão no aparador e exigi. “Eu quero esse dinheiro até amanhã! Quanta coisa eu já fiz por você?!.. É hora de me ajudar! Eu te peço, quero esse dinheiro até amanhã. A dona Marileia estava guardando, olhou espantada. O Luiz Devós que estava na porta, disse: “Até eu vou acreditar nesse santo”. Eu lhe disse: 'Dobre a língua, que ele não é santo é anjo, é um Espírito de Luz, nosso padroeiro. Vai ao banco que esse dinheiro vai sair'. O Luiz saiu rindo. No dia 30 de dezembro, o último dia que o banco abriria, eu no meu gabinete, chega o Devós de novo: “Doutor, faça o favor de sentar, porque o senhor não vai acreditar no que tenho a dizer!”. Eu respondi: 'Não precisa dizer, eu sei, o dinheiro chegou!! Agora você acredita nesse 'Santo', não'?
ET – Mas o fato é que o Devós achou que o Sr. estivesse ficando doido, quando gritou com o 'santo'…
José Alberto (rindo) – Todo mundo achou que eu estivesse ruim da cabeça. E só dez anos depois, quando eu estava na farmácia do Herculano, distribuindo o anel de São Miguel aos amigos, o Devós me revelou que não tinha ido ao banco, nada. Não acreditou em nada do que eu disse. Por coincidência, no dia seguinte, uma funcionária do Bemge, a Lenira, de saudosa memória, encontrou com ele na rua e perguntou por que ele não foi buscar o dinheiro que havia sido depositado. Foi quando ele correu ao gabinete para me dar a notícia. Sempre rezei a oração de são Miguel, hasteava a bandeira, mandava rezar missa. O interessante é que funcionários que falavam que eu era meio doido da cabeça, no final, quando me despedi, todos queriam uma oração de São Miguel.
(...)