Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

Bisneta do Barão da Rifaina doa documentos para o Arquivo Público

Edição n° 1232 - 19 Novembro 2010

Alice de Paula Vieira Oliveira, 91, bisneta do Barão da Rifaina (Vicente de Paula Vieira) esteve em Sacramento para doar preciosas relíquias para o Arquivo Público da cidade: vários exemplares de jornais do final do século IXX e o fraque com que seu sogro, o vereador à Câmara de Sacramento, em 1906, Lafaiete de Oliveira Goulart, se casou. O histórico acervo foi entregue pessoalmente ao secretário de Cultura e Turismo, Amir Salomão Jacób, na manhã do dia 17.

Ao lado da neta, Magda Gomide Alves, sacramentana, residente em Franca, Dona Alice, com uma lucidez a toda prova, contou detalhes de sua vida e deu boas risadas lembrando os tempos antigos.  “Meus avós paternos eram Ernesto de Paula Vieira e Amélia. Sou filha de Agnelo de Paula Vieira e de Maria Cândida Vieira. O meu parentesco com o Barão, portanto, é desse lado paterno”, diz e se espanta ao ser questionada sobre a data da morte do Barão.

 - “Nossa Senhora!! É muito antigo isso, não me lembro, não. Meu avô Ernesto eu conheci e me lembro de ele andar muito, viajava muito. Ele tinha uma farmácia na fazenda, que o papai vendeu para o Ferrúcio Bonatti, ali na região da Jaguarinha. Era chamada fazenda Vieirinha. Eu era criança, nasci  na fazenda. Além de papai, meus avós tinham outros filhos, Ismar, Ernesto, que tinha o mesmo nome do vovô, e era apelidado de Ernestinho, os outros eu não me lembro, mas eram dez ou onze”, conta.

Alice é a terceira dos nove  filhos de Agnelo e Maria Cândida. “Éramos nove filhos:  Ademar, José, já falecido, eu, Ernesto, que é marido da Nenzinha, Leacir, Ari, aliás são dois Aris, uma menina que faleceu, aí ela teve outro filho e pôs o nome de Ari, e a Alzira. 

Recordando sua infância, Dona Alice conta que nasceu na fazenda Vieirinha, em 28 de setembro de 1919 e ali foi criada. “Na verdade, vivi 44 anos morando na zona rural. Mas, depois que papai vendeu a fazenda, comprou outra na Água Quente e mudamos pra lá. Vieram, então as usinas no rio Grande e ia inundar tudo. Ele  vendeu e voltamos para a fazenda do meu sogro e de lá mudamos para Araguari. Retornamos para a fazenda aqui em Sacramento e quando papai a vendeu mudamos para Pereira Barreto”, em 1963, onde estou até hoje”, recorda.

Ainda adolescente, Dona Alice se casou. Conta que tinha apenas 15 anos quando se uniu em matrimônio com João de Souza Oliveira, mais conhecido por Joanin, então com 25 anos, que era filho de nosso conhecido 'Zé Lafaiete'. Juntos constituíram família e tiveram sete filhos:  Adalgisa, Washington, Agnelo, Lucy, João Luiz, Ivo e Nelson (falecido) todos residentes noutras cidades. Joanin faleceu em 1979. 

 

Jornais de 1899 foram salvos do fogo 

 

Sobre a doação dos alfarrábios ao Arquivo Público, Da. Alice explica como guardou tudo. “Quando uma pessoa morre, o pessoal dá um limpa e já quer jogar tudo fora. Quando meu sogro faleceu começaram a jogar fora todos seus pertences e eu adoro coisa antiga, foi quando guardei os jornais, que já estavam prá ir pro fogo”, conta.

Lembrando que Joanin era 'meio nervoso', conta mais que certa vez o marido estava mostrando os jornais a algumas pessoas e uma delas disse alguma coisa que o contrariou. Não pensou duas vezes, jogou tudo no fogo.  “Alguém  falou alguma coisa de que ele não gostou, aí ele embolou tudo e jogou no fogo,  eu fui e acudi”, diz mostrando, inclusive a roupa centenária do casamento do sogro, Lafaiete de Oliveira Goulart, um belo fraque muito bem conservado

“- Meu sogro era político, foi vereador de 1908 a 1911, quando era secretário da Câmara, o ‘Seu’ Eurípedes Barsanulfo. Lafaiete era pai do Zé Lafaiete, pessoa que tinha fama de mentirosa, aqui em Sacramento. Mas meu sogro não era mentiroso, não”, ressalva. Eu fui embora daqui sabendo que todos conheciam o Zé Lafaiete”, conta com uma gostosa gargalhada. 

Na avaliação do secretário Amir Salomão Jacob, “a roupa de Lafaiete Goulart era a roupa da época, em muito bom estado. Impecável e muito bem cuidada. Agora, sobre a doação dos jornais, é interessante, porque Da. Alice está nos deixando um exemplar do jornal, 'Gazeta do Sacramento', que muitos já citaram, mas ninguém nunca tinha visto um exemplar. Esse 'Gazeta do Sacramento' é tido como um jornal fundado por Eurípedes Barsanulfo, inclusive,  a bibliografia espírita fala desse jornal, mas não havia nenhum exemplar e agora ela nos traz”, conta.

Segundo o secretário, o 'Gazeta do Sacramento' veio confirmar o que ele diz no livro que escreveu, ‘Eurípedes Barsanulpho sob a luz da história’. “Eu falo no livro que quem fundou esse jornal foi João  Gomes de Melo, promotor público de Sacramento, na época, e agora está comprovado. O Jornal  foi fundado por João Gomes de Melo. Não fala aqui de Eurípedes  Barsanulfo, nem como redator, e o jornal não tem expediente, mas eu sei que Eurípedes era redator do ‘Gazeta’, porque outro jornal da época, o 'Cidade do Sacramento' traz a notícia. Havia uma briga entre os dois jornais.  O Cidade tem uma coluna chamada “Pro veritas” e a coluna só era usada para desmentir o que se falava no ‘Gazeta’. E é no 'Cidade do Sacramento' que cita Eurípedes  como redator do 'Gazeta'. 

Outro jornal entregue por Da. Alice é o 'Novo Echo'. A edição é de 1899 e já estava no seu quarto ano, conforme se pode ver no exemplar. “Para o Arquivo a doação  é uma preciosidade esse acervo”, reconhece Amir, agradecendo a doação. “É a história da comunicação local, muito importante. Estamos resgatando pelo menos um exemplar desses jornais. E é muito importante, comprovar que em Sacramento, no ano de 1899, conformo anúncio neste exemplar do 'Novo Echo', já havia  a festa de Nossa Senhora D´Abadia. Até então, a documentação mais antiga que tínhamos datava de  1903. Isso é resgate histórico”, reconhece mais, informando que “os documentos ficam no arquivo e o fraque de do casamento de Lafaiete Goulart, irá para o Museu Municipal Corália Venites. É uma riqueza”. 

Para Da. Alice é uma felicidade doar esse acervo para a cidade. “É uma felicidade. Minha sogra entregou-me esse terno há mais de 40 anos e eu vim cuidando dele. Estou com a idade avançada e como a moçada não dá valor a essas coisas, decidi trazer para a cidade dele e foi um prazer muito grande doar essas coisas para Sacramento”, finaliza. 

A neta Magda, nascida na região de Jaguarinha, casada com Antônio Evaristo Alves, dois filhos, residindo hoje em Franca, acompanhou a avó até Sacramento, por reconhecer também a importância da doação. “Gosto muito dessa parte histórica, sempre estou me envolvendo na história da família e é  gratificante ver esse acervo sendo doado, parte da família passa a ser história no museu da cidade. Meu avô foi um homem que trabalhou por Sacramento, teve participação na construção da a Santa Casa, e saber que minha avó é esse patrimônio histórico, é uma felicidade. Para ela é um dever cumprido entregar essa roupa, os documentos, hoje ela termina a sua missão de guardiã desse acervo”, diz.